Todo estudante brasileiro tem obrigação de saber quem foi Luiz Gama, grande líder abolicionista. De todos os projetos abolicionistas apresentados no Brasil no século XIX, foi justamente o mais racista e excludente o adotado pelo Estado brasileiro. Luiz Gama lutou pela libertação e inclusão do povo negro em nossa sociedade, caso suas propostas tivessem sido adotadas, hoje em dia certamente teríamos um Brasil diferente, mais humano. O Blog do Cappacete recomenda a leitura da biografia de Luiz Gama, escrita por Luiz Carlos Santos, militante do movimento negro brasileiro.
Luiz Gama, o radical
Luiz Gama não foi apenas abolicionista, foi o mais importante deles. Radical, acusado pela elite de subversivo e até de agente da internacional socialista, dizia, por exemplo, ser ato de legítima defesa um escravo matar o senhor. Este é o retrato traçado pelo jornalista Luiz Carlos dos Santos, no livro "Luiz Gama". Leia Mais.
Segundo o jornalista, que também é professor, mestre em Sociologia pela USP e militante do Movimento Negro “o nome de Luiz Gama e a ação política desenvolvida por ele no século XIX são fundamentais para o entendimento da ação negra durante o período escravocrata". "Foi dos primeiros a trabalhar com o conceito de negritude”, acrescenta.
Uma das evidências disso, segundo ele, está no fato da mulher negra ocupar a posição de musa na sua produção poética, o que não é pouca coisa, considerando o fato de que a escravidão negava ao negro a dimensão humana. “Ele nunca teve nenhuma dúvida do lugar pelo qual optou. O de ser negro”, afirma o jornalista.
Líder político
Advogado, jornalista, poeta, membro da Maçonaria e fundador do PRP, Gama morreu em 1.882 tendo libertado por meio de sua ação nos tribunais 500 negros. “Trata-se de uma biografia singular que articula luta com inteligência”, afirma Luiz Carlos.
Na biografia, o pesquisador mostra o menino negro que nasceu livre em Salvador, na Bahia, filho de Luiza Mahin, com um comerciante português, como, após vendido aos 10 anos pelo próprio pai, aprendeu a ler na juventude por conta própria e a trajetória de advogado brilhante até tornar-se símbolo da luta abolicionista e republicana. Resgata também nas 120 páginas, “o agitador incansável das causas negras, perseguido muitas vezes e ameaçado de morte”. “Sua vida é uma forte referência para a nossa história e permite uma releitura da história do Brasil”, acrescenta.
Radical e consequente
Para Luiz Carlos uma das facetas mais importantes da vida de Luiz Gama foi a sua radicalidade, o que hoje poderia ser comparado no século XX com a atitude política assumida por Malcolm X no Movimento de Direitos Civis americanos, ou mesmo a linguagem dura e cortante dos rappers brasileiros, quando falam do genocídio da juventude negra, nos dias de hoje.
Ele trabalhou com as leis vigentes sob o Império para fazer a defesa da liberdade dos negros, sustentando o princípio de que “um negro que mata o seu senhor, o faz em legítima defesa. “Isso no século XIX era altamente subversivo. A elite da época o tinha como subversivo e até agente da internacional socialista”, afirma.
Como advogado (sem formação acadêmica), ele utilizou os conhecimentos da Lei e do Direito para a libertação de cerca de 500 negros.
Reação da elite
A elite escravocrata do Império reagiu com muita veemência e Gama foi muito perseguido e ameaçado. Além de radical, subversivo, agente da internacional socialista”, era chamado pejorativamente de “O Bode”.
Segundo o jornalista, o termo pejorativo poderia estar associado à condição de maçom (chegou a vice-presidente da Loja Maçônica América, hoje Luiz Gama), ou ao fato de que usava um vistoso cavanhaque. “Entretanto, também pode ter relação com a idéia de que negros fedem como bodes, cheiram mal, presente no pensamento racista da época”, afirma.
Um outro dado que ele destaca é que Luiz Gama não ficou numa visão economicista ou radialista da questão negra. Para se contrapor aos ataques, republicano convicto, tornou-se um dos fundadores do Partido Republicano Paulista (PRP) e adquiriu representatividade política, através de artigos nos jornais e na atuação como rábula (advogado sem formação acadêmica). "Ele não separou o social do racial e combateu tanto a escravidão quanto a monarquia", frisa o autor.
Estatuto
Luiz Carlos acredita que se ainda estivesse vivo, pela perspectiva da militância que sempre exerceu, Luiz Gama estaria ao lado dos que não aceitam o acordo SEPPIR/DEM para aprovar no Senado o Estatuto da Igualdade Racial.
“Eu acredito por tudo o que vi da personalidade dele, que estaria próximo dos negros militantes do movimento negro de não aceitar a adesão institucional para esvaziar a presença e a participação negra no país, por meio de políticos escolhidos a dedo para fazer esse papel”, afirma.
Para Luiz Carlos, “no caso do Estatuto, o tempo que levou na tramitação foi estrategicamente pensado para esvaziar o seu conteúdo. Foi apropriado por setores personalistas e individualistas” “Um negro como Luiz Gama dificilmente aceitaria essa situação como estamos aceitando por conta da nossa dispersão e desmobilização", acrescenta.
Ele não tem meias palavras para classificar o processo de votação do Estatuto, recentemente pelo Senado da República. “É uma monstruosidade histórica, uma provocação à população negra brasileira, promovida por pessoas sem qualquer comprometimento com o negro brasileiro. Não está desvinculada das intenções maiores de proprietários que se apropriaram das terras de remanescentes de quilombos. E atende aos interesses dos setores da sociedade brancos, anti-cotas anti-ações afirmativas, como Demétrio Magnolli e Yvone Maggie, porta-vozes dessas posições. A questão racial no Brasil é muito séria é muito profunda, e o que pretendem esses setores é acabar com a presença negra”,
Selo Negro
O livro faz parte da Coleção Retratos do Brasil Negro, coordenado por Vera Lúcia Benedito, mestre e doutora em Sociologia/Estudos Urbanos pela Michigan State University (EUA) e pesquisadora dos movimentos sociais e da diáspora africana no Brasil e no mundo.
Luiz Carlos é também autor do livro O Negro em versos - Antologia da poesia negra brasileira, e fez parte da direção da Sociedade de Intercâmbio Brasil África (Sinba) e foi coordenador do Núcleo de Consciência Negra da USP. Atualmente é consultor de História do Museu Afro Brasil e docente em cursos de formação de professores, nos quais ministra palestras sobre as Leis 10.639 e 11.645 que estabeleceram as disciplinas História da África e da Cultura Afro-Brasileira e Indígena no currículo das escolas brasileiras.
Caro Cappacete
ResponderExcluirAgradável surpresa em ver pela primeira vez um post sobre um personagem de grande importância para nossa história.
Sua mãe Luisa Marin, se não me engano, também teve grande e importante papel na luta contra a escravatura. Pouco sei sobre ela, parece que foi presa em Salvador e levada para o Rio de Janeiro e dai em diante nada sei.
Vou copiar este poste para meu blog.
Abraços