quinta-feira, 31 de maio de 2012

SP usa prisão provisória para “controle” da população de rua


O fascismo grassa em SP


De acordo com o estudo da Pastoral Carcerária e do ITCC, medida tem sido utilizada pelo governo paulista “como instrumento político de gestão populacional”

Relatório elaborado pela Pastoral Carcerária Nacional e pelo Instituto Terra,Trabalho e Cidadania (ITTC) afirma que a prisão provisória tem sido usada em São Paulo “como instrumento político de gestão populacional, voltado ao controle de uma camada específica da população”. A Agência Brasil teve acesso à integra do relatório, que deve ser divulgado essa semana.
De acordo com o documento, o uso da prisão provisória tem sido dirigido a usuários de drogas e moradores de rua da capital paulista. São Paulo é o estado com maior quantidade de presos provisórios do país. De um universo de 174 mil detentos, 57,7 mil estão privados de liberdade e ainda não foram julgados.
Segundo a pesquisa, juízes e promotores corroboram a seletividade e a violência promovidas pelas polícias e raramente questionam a necessidade da prisão cautelar. “Há uma grande resistência dos operadores [do direito], que não se dão ao trabalho nem mesmo de atentar para o caso concreto, emitindo cotas e decisões caracterizadas pela generalidade e pela pobreza argumentativa”.
O relatório diz ainda que “inverte-se o princípio da presunção de inocência, mantendo-se a pessoa privada de liberdade de forma automática, como se o estado de flagrância constituísse prova suficiente da culpabilidade ou como se a prisão cautelar funcionasse como a antecipação de uma pena que não será aplicada ao final do processo”.
De acordo com o documento, inúmeros relatos de presos provisórios denunciam que, no momento da abordagem policial, quando estavam utilizando drogas em grupo, os policiais liberavam diversos usuários e prendiam alguns outros, em uma forma discricionária de condução da abordagem.
“A escolha entre quem seria liberado ou preso era fundada na ficha do indivíduo – reincidente ou primário –, na sua cor ou raça, na sua vestimenta, na sua classe social. Foi possível perceber o imenso poder que a atual Lei de Drogas confere aos policiais, que podem tipificar determinada conduta como bem desejam”, diz o relatório.
O coordenador do Núcleo de Situação Carcerária da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, Patrick Cacicedo, também entende que há abuso por parte das autoridades na hora de prender as pessoas provisoriamente. “O estado quer resolver questões sociais pelo sistema penal. Por isso, há hoje um encarceramento em massa”.
A Agência Brasil procurou as secretarias de Administração Penitenciária e de Segurança Pública de São Paulo, o Ministério Público e o Tribunal de Justiça de São Paulo, mas até o fechamento desta reportagem não havia recebido resposta.
O relatório é resultado do Projeto Tecer Justiça: Repensando a Prisão Provisória, desenvolvido pelo Instituto Terra, Trabalho e Cidadania (ITTC) e pela Pastoral Carcerária Nacional para o atendimento e a defesa técnica de presos provisórios recém-incluídos no Centro de Detenção Provisória 1 de Pinheiros e na Penitenciária Feminina de Sant’Ana. A pesquisa foi realizada no período de junho de 2010 a dezembro de 2011.
O documento analisa diversos casos de permanência em detenção supostamente ilegal, entre eles o de um homem preso sob acusação de ter roubado R$ 1,00 e um bilhete de transporte público mediante ameaça verbal, sem uso de arma ou qualquer utensílio que pudesse colocar em risco a integridade da vítima.
No entanto, apesar de ser primário e nunca ter sido sequer processado, o homem permaneceu seis meses e doze dias preso antes da sentença. As sentenças judiciais também se apresentam desproporcionais: nesse mesmo caso, o homem foi condenado à pena de cinco anos e quatro meses de reclusão em regime inicial fechado.
De acordo com o assessor jurídico da Pastoral Carcerária Nacional, José de Jesus Filho, em muitos casos, os presos provisórios são usuários de drogas que ficam até um ano encarcerados. Além disso, é bastante elevado o número de pessoas que afirmaram morar na rua.
No ano passado, entrou em vigor a Nova Lei das Prisões, que beneficia presos não reincidentes que cometeram crimes leves, puníveis com menos de quatro anos de reclusão, e que não ofereçam risco à sociedade. Em tais casos, a prisão pode ser substituída por medidas como pagamento de fiança e monitoramento eletrônico.
Segundo o relatório, no entanto, há diversos casos nos quais o réu estava sendo acusado de delito para o qual poderia receber uma medida alternativa à prisão. Porém, mesmo assim, o acusado era mantido preso cautelarmente até a sentença. Somente então o réu é colocado em liberdade, até mesmo quando condenado, porque o período sob prisão provisória geralmente foi maior que o tempo de condenação.
O Instituto Terra, Trabalho e Cidadania é uma organização não governamental, com sede em São Paulo, constituída por profissionais que atuam em defesa dos direitos dos cidadãos. Atualmente, desenvolve projetos em parceria com a Secretaria de Administração Penitenciária do Estado de São Paulo e a Defensoria Pública da União, entre outras instituições. A Pastoral Carcerária é uma organização ligada à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), promovendo direitos da população custodiada nos sistemas prisionais do país.


“Doutrina do caos” que prevaleceu na Líbia ameaça Síria e Grécia, diz líder português

Opera Mundi


Para José Manuel Pureza, do Bloco de Esquerda, toda intervenção estrangeira, por mais bem intencionada que seja, é uma forma de controle

A intervenção da OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte) na Líbia em 2011 não apenas contribuiu para derrubar o regime do coronel Muamar Kadafi como também abriu um precedente para que questões envolvendo violações de direitos humanos sejam usadas como desculpa para violar soberanias nacionais. A opinião é do português José Manuel Pureza, professor de Relações Internacionais pela Universidade de Coimbra e ex-membro do Parlamento português pelo Bloco de Esquerda.


Para Pureza, que está no Brasil para uma série de palestras, esse roteiro não foi acidental e pode se repetir no caso da crise na Síria e até em países que ameaçam o status quo da Europa, como a Grécia. Ele acredita que lições podem ser tiradas com os erros na Líbia para não se repetirem no caso sírio. “A rejeição de alguns passos [diplomáticos para se chegar à intervenção no caso da Líbia] não foi casual. Construir uma realidade única durante um conflito é a maneira mais hábil para se forçar uma realidade prática. Isso vale para a Síria, a Líbia e até a Grécia: é a doutrina do caos”, afirma.



Novo humanitarismo que relativiza soberanias e justifica intervenções é uma armadilha, diz José Manuel Pureza



No último dia 21, o professor participou de um seminário no Programa de Pós-Graduação San Tiago Dantas (Unesp, Unicamp e PUC de São Paulo), no centro de São Paulo, e conversou com a reportagem de Opera Mundi.



Segundo José Manuel Pureza, o conceito jurídico-diplomático que baseia essas intervenções é o da “responsabilidade de proteger”, que sofreu um “alargamento” ao longo da última década. Esse conceito, abordado pela primeira vez em 2001, propõe alterações doutrinárias e práticas no tratamento das intervenções humanitárias pelo Direito Internacional. Opta por uma abordagem mais abrangente, com a proposta de reagir, prevenir e reconstruir regiões.



“Qualquer intervenção, por mais bem intencionada que seja, é uma forma de controle”, afirma. De acordo com Pureza, há uma percepção geral da opinião pública de que uma intervenção como a ocorrida na Líbia nasce de boas intenções. Estas são baseadas em dois eixos principais: um programa de “paz liberal”; e a evolução de um novo conceito de humanitarismo. No entanto, ignora-se que essas intervenções ocorrem há algum tempo em um contexto eminentemente político e jurídico.



A paz sob as armas



O programa de paz liberal, na opinião do político português, prevê uma “paz positiva”, que é exigente e ambiciosa, “não se dá apenas via o silêncio das armas” e pressupõe a noção de transformação social, atacando as raízes dos conflitos, não apenas os efeitos. Para essa paz perdurar, segundo essa teoria, seria necessário um redesenho da engenharia social, política, institucional, jurídica e econômica da área em conflito.



“Em última análise, esse programa faz apologia do intervencionismo internacional. As causas de violações e conflitos são endógenas, e as respostas, invariavelmente, exógenas”, diz Pureza. “O que tem sido a aplicação concreta? A pacificação através da liberalização econômica e política”, analisa o professor. Ele alerta para o fato de esta medida está erradamente cercada pela aura de um discurso de consenso comum, desprovido de carga política e ideológica, e disfarçada sob um natureza técnica.



A armadilha do novo “humanitarismo”



Esse segundo eixo tem origem acadêmica e reforça críticas de ONGs que passaram a considerar as operações humanitárias as quais estavam envolvidas como simplesmente paliativas ou, pior, que criavam condições para os conflitos continuarem. Após a Guerra Fira, passou-se a ter uma visão crítica do velho humanismo: imparcial, isento e universal.



Na opinião de Pureza, o real objetivo dessa transformação de atividade humanitária para uma suposta militância é a contenção de periferias turbulentas. “O discurso é benigno, convincente, moral e facilmente aceitável. Mas é uma armadilha”, Segundo Pureza, todo discurso tido como hegemônico esconde suas verdadeiras agendas.



O “humanitarismo” opõe o conceito de soberania em situações de lutas de libertação nacional, sem necessariamente apelar para intervenção no âmbito militar. “Esses autores acham que alguns aspectos de soberania podem ser exercidos por atores não nacionais: doadores, ONGs, instituições financeiras internacionais, por exemplo”. Se antes eram aplicados para países em situações de calamidade, como Somália e Haiti, agora são podem ser encontrados em casos semelhantes na Grécia, Portugal, Espanha e Itália, protesta o português Pureza.



“O discurso humanitário mudou. Já não se contenta só em salvar vidas, com alívio do sofrimento e da proteção das vítimas. O novo discurso não quer menos do que criar condições para não se gerar mais vítimas, o que é assumidamente um discurso político”, baseado em ações de prevenção, diz Pureza.



Nova ordem



Um dos exemplos mais claros dessa mudança é a guerra civil líbia, que na opinião de Pureza, apresenta um precedente inédito com a autorização do uso da força contra um Estado em exercício normal de suas funções.



Esse precedente pode ser encontrado a Resolução 1973 da ONU, relativa ao conflito líbio. Ela autorizou, além de uma zona de exclusão aérea e a imposição de um cessar-fogo, a utilização “de todos os meios necessários” [e Pureza ressalta esse termo] para a proteção de civis. Essa resolução apenas serviu para que as forças da OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte) bombardeassem sistematicamente as forças do governo líbio, facilitando o progresso da oposição e a derrubada do regime, meses depois. E, ao contrário do previsto, foi indiretamente responsável pela morte de milhares de civis. A medida foi aprovada por 10 votos no Conselho de Segurança da entidade, mas teve cinco abstenções (Brasil, Rússia, China, Índia e Alemanha).



Pureza lembra que países que também foram acusados de violar os direitos humanos durante a Primavera Árabe foram alguns dos principais articuladores para a aplicação do conceito da “Liberdade de Proteger”, como o Bahrein, o Catar e a Arábia Saudita.



Uma das consequências da intervenção na Líbia é que, depois dela, o êxito das revoltas populares iniciadas na Primavera Árabe ficou condicionado ao apoio de potências estrangeiras. “Marcou uma virada, tudo parou na Argélia, Marrocos, Bahrein e Iêmen [que teve mudança de regime, mas com mais dificuldade]. Os sírios pagam agora o preço do que ocorreu na Líbia”. A outra foi mais um episódio de descrédito da ONU como instituição para a manutenção da paz.



Pureza esclarece que não é contra a proteção de civis, mas que o retrocesso da doutrina da “responsabilidade de proteger”, no caso da Líbia, nada tem a ver com o apoio a estados frágeis.



Como passos necessários e anteriores à qualquer possibilidade de intervenção, Pureza cita o envio de observadores, a formulação de planos de paz e a criação de corredores humanitários, por exemplo. As sanções econômicas contra o regime também podem fazer parte desse escopo, mas Pureza acredita que elas têm, na prática, pouco alcance.






Comissão antibullying em escolas públicas e privadas



bullying
projeto antibullying trata do combate à prática de bullying nas instituições de ensino
Em análise na Câmara, o Projeto de Lei 3036/11 obriga as escolas a instituir comissão antibullying. De autoria do deputado licenciado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), a proposta abrange todas as escolas, públicas e privadas, da educação infantil e do ensino fundamental e médio.
bullying é definido na proposta como “qualquer ação intimidatória que ridicularize, ofenda ou agrida, física e psicologicamente, praticada por alunos matriculados contra alunos também matriculados”.
Pelo projeto, as comissões deverão ser integradas por membros do corpo docente e por representantes dos pais e mães de alunos. Elas terão atribuição de elaborar planos de prevenção e de repressão ao bullying, a fim de permitir intervenção imediata e fazer cessar a ocorrência.
A proposta prevê a suspensão do agressor e a proteção do aluno vítima; e a notificação imediata dos pais ou responsáveis, sendo que, nos casos graves, os alunos envolvidos deverão ser encaminhados ao Conselho Tutelar.

Informação semestral

A comissão deverá receber as denúncias e prestar informações semestrais ao órgão executivo de educação competente e a todos os pais e mães de alunos.

A escola privada que infringir as normas previstas estará sujeita à aplicação de multa administrativa, no valor de vinte mensalidades escolares. Já a escola pública infratora deverá ser autuada e estará sujeita a penalidades administrativas aplicadas pelo órgão executivo de educação competente.
Aguinaldo Ribeiro considera urgente implantar o combate ao bullying nas escolas. “Não podemos deixar toda a responsabilidade para o jovem ou a criança vítima da agressão”, diz ele, acrescentando que cabe aos adultos e às instituições identificar a ocorrência.
Segundo o deputado, “tanto os profissionais dos estabelecimentos de ensino, familiares ou conhecidos das crianças que são vítimas da perseguição e da violência precisam estar atentos para esses problemas e agir imediatamente.”
Ele alerta que o problema não pode ser tratado como mera “brincadeira de criança”, e afirma que as escolas não podem mais se esquivar e deixar o problema sem solução, “lavando as mãos”. As leis vigentes, diz o deputado, tratam de medidas preventivas e educativas, mas deixam de proteger os humilhados e atacados diariamente.
O projeto foi apensado ao PL 1785/11, do Senado, que incumbe os estabelecimentos de ensino de promover ambiente escolar seguro e adotar estratégias de prevenção e combate ao bullying. As propostas terão análiseconclusiva das comissões de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado; de Educação e Cultura; de Finanças e Tributação; e de Constituição e Justiça e de Cidadania.

quarta-feira, 30 de maio de 2012

Relatora da ONU sobre Nova Luz: prefeitura quer destruir bairro para destruir as pessoas


Sem limites na defesa do capital imobiliário



Rede Brasil Atual


Em debate, moradores e comerciantes expõem que continuam a não entender os motivos da gestão de Kassab para a privatização de bairro no centro e se queixam de falta de diálogo.

A arquiteta e urbanista Raquel Rolnik, professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP (FAU-USP), defendeu hoje (29) que a prefeitura da capital paulista tenta destruir as características históricas da região da Luz, onde está o polo comercial da rua Santa Ifigênia, para abrir novas frentes para o mercado imobiliário. “Destruo o território para em seguida destruir as pessoas que estão ali... Que são focos de resistência”, disse a especialista, relatora da ONU para o direito à moradia adequada. A região é alvo do projeto "Nova Luz", que prevê a requalificação de 45 quadras com a transferência da administração para uma empresa ou consórcio de empresas privadas que poderão desapropriar e comercializar imóveis.
Raquel participou do debate sobre planejamento urbano “Nova Luz – Quem está ganhando? Quem está perdendo?”, com os urbanistas do Consórcio Nova Luz Amelia Reynaldo e Lourenço Gimenes. Para moradores e comerciantes da região atingida pelo projeto, a iniciativa do prefeito Gilberto Kassab (PSD) continua sendo um “sonho que a prefeitura vende”, sem conexão com a realidade.
Para a relatora da ONU, a prefeitura construiu a ideia de "cracolândia", supostamente tomada por dependentes químicos, para justificar o "Nova Luz". Outras ações como a Operação Sufoco, realizada em janeiro, e a retirada dos moradores da ocupação Mauá, de sem-teto, fazem parte da política do poder público municipal para anular a resistência de quem mora e trabalha na área. “O que está colocado para a Luz com a operação militar de 3 de janeiro deste ano (Operação Sufoco), com a reintegração de posse da Ocupação Mauá, combinada com a destruição que a prefeitura fez daquele lugar (ao classificar de cracolândia) e a concessão urbanística na Nova Luz é uma espécie de solução final”, disse.
Solução final foi o termo usado pelo nazismo para definir o extermínio da população judaica durante a Segunda Guerra Mundial. “A solução final (em São Paulo) é: tentei de várias formas entrar naquele lugar e desconstituir aquele tecido, abrir aquele espaço para outra coisa. Não consegui porque aquele espaço resiste, tem vida, organização, movimento. Então destruo o território para em seguida destruir as pessoas que estão ali com operação militar que viola radicalmente os direitos de quem está ali e desconstituo”, interpretou.
Raquel considera que a questão da "Nova Luz" é “um processo de conflito em marcha” porque São Paulo é uma das poucas cidades globais cujo centro histórico resiste. Para a historiadora Hertla Franco, o tratamento dado ao patrimônio tem sido de “eliminar a história e liberar terrenos para novas atividades do mercado imobiliário”.

Centro vivo

A urbanista do Consórcio Nova Luz Amélia Reynaldo admitiu que o “centro é vivíssimo” e argumentou que o capital privado “deve construir a cidade social de todos”. O consórcio é formado pelas empresas Concremat Engenharia, Companhia City, Aecom Technology Corporation e Fundação Getúlio Vargas (FGV) e é responsável pelo projeto urbanístico.
O arquiteto e urbanista Lourenço Gimenes, que também faz parte do consórcio, disse não se espantar com o "combate aguerrido" à concessão urbanística, mas defendeu o projeto porque ele indica “como fazer de forma coerente, como os empreendedores vão atuar, como deve ser a devida densidade”. Segundo ele, seria pior se não houvesse diretrizes para o mercado atuar.
Para moradores e comerciantes da região da Luz, as explicações do consórcio contêm erros e mostram incoerências da administração Kassab. “A prefeitura sempre tenta enfeitar e na verdade prospectar um sonho. Não é nada daquilo”, apontou Rafaela Rocha, advogada da Associação de Comerciantes da Santa Ifigênia (ACSI). “Sempre fica de lado o aspecto social. Não existe programa de atendimento social e econômico para a população afetada.”
“Sempre tem um 'inicialmente' na frente de qualquer explicação. Sempre tem um 'foi estimado'. Não tem nenhuma resposta concreta e não vai ser interesse dar explicações para a gente”, analisou Antonio Santana, da Associação de Moradores da Santa Ifigênia (AMSI).

Regulação do mercado

O promotor de Justiça de Habitação e Urbanismo da capital, Maurício Antonio Ribeiro Lopes, respondeu da plateia à indagação de Raquel Rolnik – que seria dirigida aos técnicos do consórcio Nova Luz – sobre quais instrumentos estão previstos para manutenção da população e das atividades existentes frente à valorização imobiliária. “O instrumento chama-se mercado. Foi isso que nós ouvimos do (Miguel) Bucalem, secretário de Desenvolvimento Urbano”, lembrou.
Segundo o chefe da Assessoria Técnica da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano, Luis Ramos, ainda não há detalhes sobre a licitação dos 45 quarteirões do bairro da Luz para empresa privada, que está prometida para este ano. “Sairá quando tiver todos os elementos. Não há detalhes nesse momento.”

segunda-feira, 28 de maio de 2012

Cachoeira arrumou jatinho para Demóstenes e "Gilmar"


Canalha, bandido, caluniador


Carta Maior


Escutas telefônicas indicam que o contraventor Carlinhos Cachoeira providenciou um jatinho King Air para dar uma carona ao senador Demóstenes Torres e a "Gilmar", no retorno de uma viagem da Alemanha ao Brasil. Em uma ligação no dia 23 de abril, um ex-vereador do PSDB pede autorização para buscar o "Professor" Demóstenes em um jatinho, que está com o "Gilmar". Na degravação, a PF questiona entre parênteses (“Mendes?”). O ministro do STF foi a Europa neste período para participar de um congresso internacional de Direito.

Brasília - Escutas telefônicas interceptadas pela Polícia Federal (PF), com autorização da Justiça, durante a Operação Monte Carlo, questionam se o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, “pegou carona” em um jatinho fornecido pela quadrilha de Carlinhos Cachoeira, no dia 25 de abril de 2011, quando teria retornado da Alemanha ao Brasil, na companhia do senador Demóstenes Torres (ex-DEM-GO).

Uma ligação interceptada pela PF no dia 18/4/2011, às 18:08 horas, mostra Carlinhos Cachoeira informando ao ex-funcionário da Delta e ex-vereador pelo PSDB, Wladimir Garcez, também preso durante a Operação Monte Carlo, que Demóstenes estava em Berlim.

Em nova ligação, no dia 23/4/2011, às 19:31 horas, Wladimir pede autorização à Cachoeira para buscar o “Professor” (um dos codinomes de Demóstenes, segundo a PF), em São Paulo, no jatinho do Ataíde (o suplente de senador Ataídes de Oliveira, PSDB-TO) . Diz que está ele e Gilmar. Na degravação, a PF questiona entre parênteses (“?Mendes?”). 

Mais tarde, às 20:24 horas, Wladimir liga novamente para Cachoeira dizendo que não conseguiu falar com Ataíde e que mandaria o avião de Rossini. Cachoeira pegunta qual é o avião de Rossini e Wladimir responde: um jatinho King Air.

Cachoeira: um pequeno, né?

Wladimir: é... aí eu peguei falei com ele. Ele falou não, não preocupa que eu organizo. Porque tá vindo ele e o GILMAR, né? Porque não vai achar vôo, sabe?

Cachoeira se despede falando que ligaria para Demóstenes em Berlim.

Às 20:38 horas, Cachoeira liga novamente para Wladimir. Tratam de outros assuntos. Depois, voltam a discutir a “carona”. Wladimir diz que Demóstenes chegará às seis da manhã do dia 25/4 e que deixará tudo organizado para o piloto ir buscá-lo.

No dia 25/4, às 12:10 horas, Wladimir diz à Cachoeira que o senador já chegou.

Gilmar Mendes foi à Europa participar de um congresso internacional em homenagem ao jurista italiano Antônio D’Atena, promovido pelo Fundação Peter Häberle e pela Universidade de Granada, da Espanha. O congresso foi aberto no dia 13/4/2011, mas a participação de Mendes se deu na manhã do dia seguinte, com a palestra “A integração na América Latina, a partir do exemplo do Mercosul”.

Não há registro públicos do que Mendes teria feito no restante do tempo em que permaneceu fora do Brasil. À revista Veja, ele teria dito que se encontrou com Demóstenes em Berlim, na Alemanha. Ainda segundo a Veja, o ministro teria uma filha residente em Berlim e, por isso, frequentaria a cidade com regularidade.

Não há registros públicos de quais atividades Demóstenes teria ido desenvolver na Europa, mas levantamento feito por Carta Maior demonstra que ele não participou das votações realizadas no plenário do Senado entre 13 e 25/4/2011.

Em nota oficial, Lula manifesta indignação

A assessoria de imprensa do Instituto Lula divulgou nota oficial onde o ex-presidente manifesta indignação com o teor da matéria publicada pela revista Veja. A nota afirma:

Sobre a reportagem da revista Veja publicada nesse final de semana, que apresenta uma versão atribuída ao ministro do STF, Gilmar Mendes, sobre um encontro com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, no dia 26 de abril, no escritório e na presença do ex-ministro Nelson Jobim, informamos o seguinte:

1. No dia 26 de abril, o ex-presidente Lula visitou o ex-ministro Nelson Jobim em seu escritório, onde também se encontrava o ministro Gilmar Mendes. A reunião existiu, mas a versão da Veja sobre o teor da conversa é inverídica. “Meu sentimento é de indignação”, disse o ex-presidente, sobre a reportagem.

2. Luiz Inácio Lula da Silva jamais interferiu ou tentou interferir nas decisões do Supremo ou da Procuradoria Geral da República em relação a ação penal do chamado Mensalão, ou a qualquer outro assunto da alçada do Judiciário ou do Ministério Público, nos oito anos em que foi presidente da República.

3. “O procurador Antonio Fernando de Souza apresentou a denúncia do chamado Mensalão ao STF e depois disso foi reconduzido ao cargo. Eu indiquei oito ministros do Supremo e nenhum deles pode registrar qualquer pressão ou injunção minha em favor de quem quer que seja”, afirmou Lula.

4. A autonomia e independência do Judiciário e do Ministério Público sempre foram rigorosamente respeitadas nos seus dois mandatos. O comportamento do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva é o mesmo, agora que não ocupa nenhum cargo público.




A direita já está falando em golpe de Estado


A direita está desesperada, contra o muro, o modelo de sociedade defendido pelos carcomidos está desaparecendo, exatamente por isso, é certo que essa corja tentará alguma aventura golpista. Neste momento, é bom estarmos vigilantes. Um velho babão de pijamas como o general Leônidas Pires não oferece perigo, mas suas declarações podem assanhar uma meia dúzia de lunáticos e perturbados. A essa altura do campeonato, está mais do que claro que o PIG irá apoiar qualquer iniciativa golpista, venha ela dos generais mijões de pijama, dos latifundiários escravocratas, das PM's, dos integralistas, dos bicheiros, da Opus Dei, das senhoras de Santana, etc...    


Leônidas ameaça um novo golpe. General, volte às pantufas!

As pantufas lhe caem melhor
Por Luiz Cláudio Cunha *
Especial para o Sul21

Aos 91 anos, o general Leônidas Pires Gonçalves, oficial da artilharia e ministro do Exército do Governo Sarney, recrudesceu: tirou o pijama, trocou a pantufa pelo coturno, armou o canhão, mirou a presidente Dilma Rousseff e bombardeou a Comissão da Verdade. Tudo isso numa entrevista à repórter Tânia Monteiro, de O Estado de S.Paulo (18 de maio), que funcionou como fogo de barragem para os velhos companheiros de farda envolvidos com a repressão, a tortura e o desaparecimento de presos durante a ditadura ardorosamente defendida pelo general quase centenário. É a voz militar mais graduada a contestar a determinação presidencial de investigar a verdade e é a opinião mais desastrada no coro cada vez mais idoso de velhos radicais que ainda respiram o ar saturado da Guerra Fria.
Leônidas defendeu o Exército (“sumariamente julgado e punido”), os militares (“injustiçados”), o ex-ministro da Defesa Nelson Jobim (“ele se colocava”) e atacou a presidente da República (“deveria ter a modéstia de esquecer o passado e  olhar para a frente”), a Comissão da Verdade (“uma moeda falsa, que só tem um lado”) e os que clamam pelo fim da impunidade aos torturadores (“é impossível mexer na Lei da Anistia, fruto de um acordo no passado e que foi chancelada pelo Supremo Tribunal Federal”).
A bomba mais explosiva ficou para a resposta final, em tom de ameaça: “Se quiserem fazer pressão no Supremo, o Poder Moderador tem que entrar em atuação no país”. O general não fazia, aqui, uma menção nostálgica à bonomia dos monarcas da Casa de Bragança, que ocupou no Império brasileiro a posição de árbitro entre os poderes para dar estabilidade política à nação durante 67 anos, até o advento da República.  Leônidas não clamava pelo império da moderação, mas brandia a ameaça da república da repressão, que quebrou a ordem constitucional em 1964 e impôs a anarquia ilegal da ditadura militar durante 21 anos de treva.
Leônidas: o "poder moderador" fechou por três vezes o Congresso Nacional a partir de 64

Exercício do cinismo
Um regime que teve muito poder e, como bem sabe o general Leônidas, nada teve de moderador. Fechou o Congresso três vezes, prendeu, torturou, sequestrou e matou milhares de opositores, violou a soberania da universidade e a independência dos tribunais, cassou mandatos políticos e  aposentou professores, baniu e exilou opositores, fechou sindicatos e calou sindicalistas, amordaçou a imprensa e sufocou as artes, impôs o medo e jogou o país no porão de uma longa e nada branda ditadura de duas décadas, uma das mais sangrentas do Cone Sul do continente. O nostálgico general Leônidas agora quer repetir tudo aquilo, outra vez, sob o pretexto de  ‘proteger’ o Supremo? Conta outra, general!…
A memória seletiva e precária do general esquece que a Lei da Anistia, ao contrário do que ele diz, não foi “fruto de um acordo”. Passou apertado, raspando, por apenas cinco votos (206 a 201) num Congresso dominado pelo partido da ditadura, a Arena, que mantinha sua maioria a ferro e fogo, à custa das cassações de mandatos e da violência do AI-5, para controlar o irrefreável crescimento da legenda da oposição, o MDB. A lei foi votada e formatada sob o arbítrio do general Figueiredo, em agosto de 1979, seis anos antes da queda do regime, num texto lapidado cuidadosamente pelos comandantes militares para acomodar uma esdrúxula invenção jurídica: o “crime conexo de sangue”, vil esperteza dos quartéis para equiparar torturados e torturadores com a mesma anistia — indiscriminada, desigual e injusta. Uma anistia costurada sob o molde caviloso da repressão para estender o espesso manto da impunidade sobre os crimes de quem nunca foi acusado, julgado, processado e condenado.
Com o cinismo que a idade avançada não desbotou, o general Leônidas tenta justificar os abusos de seus velhos companheiros de farda e truculência: “O soldado é um cidadão de uniforme para o exercício cívico da violência”, disse em entrevista a Geneton Moraes Neto da Globo News, sem explicar onde escavou este sofisticado raciocínio que nivela todos os exércitos pela vala comum do arbítrio. O general ignora os exemplos na História de forças armadas que se mobilizaram, em momentos cruciais, pela preservação de valores perenes da democracia e da civilização.

Fã clube do Reich
Um exército, esquece o cínico Leônidas, pode ser a reunião de homens fardados que lutam pelo exercício da liberdade contra o nazifascismo. Pode, por exemplo, ser a força armada que se levanta em defesa da Constituição, como fez o III Exército ao cerrar fileiras com o governador Leonel Brizola e o povo gaúcho na Campanha da Legalidade de 1961. Pode também se alçar pela afirmação da autoridade constitucional do presidente, como fez o marechal Henrique Lott para sufocar a quartelada golpista de 1955 que tentava bloquear a posse de Juscelino Kubitschek.  O general Leônidas, aparentemente, devia ser na sua tenra  juventude um cidadão fardado que se imaginava autorizado ao exercício cívico da violência contra a ordem constitucional e os direitos fundamentais da pessoa humana. Faz sentido.
O tenente Leônidas e o chefe, general Álcio Souto: matinê para admirar a blitzkrieg do Reich

Leônidas Pires Gonçalves perdeu a chance de ser um dos heróis brasileiros da luta da Força Expedicionária Brasileira contra o III Reich, na campanha na Segunda Guerra Mundial, simplesmente porque estava do lado errado. Aos 23 anos, foi alijado da FEB porque teve o azar de ser, na época, ajudante de ordens do coronel Álcio Souto, um notório simpatizante da Alemanha que o Brasil combateria, com seus pracinhas, na frente de batalha da Itália. No livro A Ditadura Derrotada, o jornalista Elio Gaspari conta que Souto, então comandante da Escola Militar do Realengo e chefe de Leônidas, costumava levar seus cadetes nos primeiros anos da guerra a um cinema do subúrbio carioca onde o adido militar da embaixada de Adolf Hitler costumava exibir filmes sobre os avanços avassaladores da blitzkrieg da Reich alemão. O filho Alvir, general reformado, negou tempos atrás estas empolgadas matinês, dizendo que o pai não era nazista: “Ele não admirava o Reich, mas sim o Exército alemão”, justificou, como se fosse possível separar uma coisa e outra.
Filinto Muller: a polícia de Getúlio faz estágio na Gestapo de Hitler e Himmler

Geisel e seu ídolo
O filonazismo verde-amarelo não era uma exclusividade do comandante do então tenente Leônidas, mas era extensivo aos chefes supremos do regime do Estado Novo, que se espelhava na pátria da Wehrmacht hitlerista. O major de artilharia Affonso Henrique de Miranda Corrêa, o segundo homem de Filinto Muller na chefia de polícia da ditadura de Getúlio Vargas, foi mandado à Alemanha para um estágio de um ano na Gestapo, onde acabou condecorado por seu chefe, Heinrich Himmler, o mentor da ‘solução final’ dos campos de concentração. Os dois maiores líderes militares do país, os generais Eurico Gaspar Dutra (ministro da Guerra) e Góis Monteiro (chefe do Estado Maior do Exército), não escondiam sua admiração pelo Reich.
Benito Mussolini e um admirador: o ex-capitão Ernesto Geisel

Dutra comemorou a queda de Paris sob o tacão nazista com uma festa em sua casa. Meses antes, Góis Monteiro fazia as malas para chefiar uma comitiva de oficiais que viajaria a Berlim para conhecer a “gigantesca obra de reconstrução nacional” da Alemanha quando o embarque foi abortado. As divisões Panzer de Hitler acabavam de cruzar a fronteira da Polônia, dando início à Segunda Grande Guerra. Um dos oficiais da comitiva que perdeu a instrutiva viagem foi um capitão chamado Ernesto Geisel, que se confessava um admirador do líder fascista italiano Benito Mussolini. No Brasil, a afeição de Geisel era reservada ao chefe de Leônidas, coronel Álcio Souto, que chegou ao generalato como chefe do gabinete militar do presidente Dutra, o simpatizante nazista que se rejubilou com o desfile das tropas hitleristas sob o Arco do Triunfo parisiense.
Leônidas e Herzog: “Um homem assustado faz qualquer coisa. Até se mata”

Susto e chocolate
Foi neste festivo entorno nacional-socialista que o futuro cidadão de uniforme Leônidas Pires Gonçalves forjou o seu cívico espírito da violência. “Na hora de dar chocolate, não se dá tiro. E, na hora de dar tiro, não se dá chocolate”, filosofou o general Leônidas na Globo News. Debochado, o ex-ministro do Exército desdenha das vítimas da repressão: “Quem começa guerra não pode lamentar morte”.  Ironiza as denúncias (“Hoje todo mundo diz que foi torturado para receber a bolsa-ditadura”) e duvida do assassinato do jornalista Vladimir Herzog sob torturas no DOI-CODI de São Paulo, em 1975: “Eu não tenho convicção de que Herzog tenha sido morto… um homem não preparado e assustado faz qualquer coisa. Até se mata”, explicou a Geneton Moraes Neto.
Prestes, João Goulart, Leonel Brizola: “Saíram porque quiseram. São fugitivos, não exilados”

O Leônidas que bate em Dilma e na Comissão da Verdade com espartana disciplina desenvolveu a exótica teoria de que os maiores líderes do regime deposto — Jango, Brizola, Prestes, Arraes — não foram exilados. “Eles saíram do Brasil porque quiseram. Eram fugitivos”, zombou o general, que tem a absurda certeza dos justos no regime injusto da ditadura: “Nós nunca prendemos ninguém que não tenha feito nada. De todas as pessoas presas, ninguém era inocente. Todos eles tinham alguma coisa que estavam cometendo de errado”. Na lógica cartesiana de Leônidas, a simples prisão já era, por si só, a condenação, líquida e certa. Os ídolos nazistas dos velhos comandantes de Leônidas ficariam orgulhosos do provecto general, ainda rijo na sua pétrea subordinação ao autoritarismo.

Desafio aos desaparecidos
Durante quase três anos da fase mais turbulenta da ditadura, de abril de 1974 a fevereiro de 1977, Leônidas foi o chefe do Estado-Maior do I Exército, sediado no Rio de Janeiro. Como tal, era o comandante imediato do DOI-CODI baseado no quartel da Polícia do Exército na afamada rua Barão de Mesquita, um dos endereços mais sinistros da repressão no Brasil.
Quando o quartel general do I Exército esteve sob o comando do general linha-dura Sylvio Frota,  entre julho de 1972 e março de 1974, conforme apurou o jornal O Globo, o DOI-CODI carioca era um centro de morte. Naquele espaço de 21 meses, contou o jornal, morreram 29 presos nas suas masmorras, então sob a administração do notório major Adyr Fiuza de Castro, um dos radicais mais temidos do regime. Pois bastou que ele chegasse ali em abril de 1974, diz o general Leônidas, e a paz celestial dos anjos se instalou naquele antro de terror e violência. “Não houve tortura na minha área”, jurou ele na Globo News. Na semana passada, n’O Estado de S.Paulo, o general voltou a desafiar: “Nunca apareceu nada, nem ninguém, que tivesse alegado ter sido torturado. Eu já desafiei que alguém se apresentasse na TV e nunca apareceu nada”.
Joaquim Pires Cerveira, Rubens Paiva e Eduardo Collier: incinerados, desaparecidos

Não apareceu, talvez, porque os desaparecidos jamais reapareciam, naqueles tempos amargos em que não se dava chocolate na hora de dar tiro. De acordo com o Dossiê Ditadura — Mortos e Desaparecidos Políticos no Brasil 1964-1985, publicado em 2009, a lista oficial de 138 desaparecidos políticos no país registra 31 nomes que se evaporaram no Rio de Janeiro entre 1970 e 1978. Desses, seis desapareceram justamente nos anos de 1974 e 1975, quando o DOI-CODI do Rio, que coordenava a repressão na área, estava sob o comando direto do general Leônidas. Integram a lista Armando Teixeira Frutuoso, Fernando Augusto Santa Cruz Oliveira, Jayme Amorim Miranda, Orlando da Silva Rosa Bonfim Júnior, Thomaz Antônio da Silva Meirelles Neto e Eduardo Collier Filho, que jamais poderão desmentir o general porque estão irremediavelmente desaparecidos.

Morte no entorno do general
Sabe-se agora o destino final de apenas um deles: o jovem pernambucano Eduardo Collier Filho, 25 anos, foi preso pelo DOI-CODI carioca em 23 de fevereiro de 1974, dois meses antes da providencial chegada do general Leônidas ao Rio, e acabou tempos depois virando cinzas num forno de uma usina de açúcar de Campos, interior fluminense, usada pela repressão para eliminar vestígios dos desaparecidos. A confissão foi feita pelo ex-delegado do DOPS capixaba Cláudio Guerra, que acaba de lançar Memórias de Uma Guerra Suja,  um livro devastador sobreas atrocidades do regime que dava pouco chocolate e muito tiro.
Outros seis militantes da esquerda, da lista carioca de 31 desaparecidos, sumiram em 1973, um ano antes de Leônidas desembarcar no DOI-CODI do Rio.  Entre eles, Caiupy Alves de Castro, Ramires Maranhão do Vale, Umberto Albuquerque Câmara Neto, Vitorino Alves Moitinho, Honestino Monteiro Guimarães — e o ex-major do Exército Joaquim Pires Cerveira, 50 anos, sequestrado em Buenos Aires pela ‘Operação Condor’ e trazido ao Brasil clandestinamente pelo delegado Sérgio Fleury, do DOPS paulista. Cerveira foi visto no DOI-CODI da Barão de Mesquita, duramente torturado, e acabou também incinerado no forno da usina, conforme denúncia do delegado Guerra.
A estilista Zuzu Angel e Stuart Jones: “Se aparecer morta, será obra dos assassinos de meu filho”.

No ano da graça de 1971, sumiram outros 10 militantes da lista de 31 desaparecidos do Rio, incluindo o deputado Rubens Paiva e Stuart Edgar Angel Jones, 26 anos, filho da estilista Zuzu Angel. Ela passou os cinco anos seguintes denunciando ao mundo a responsabilidade direta da ditadura brasileira na tortura e morte do jovem. Fez isso, incansável, até a estranha madrugada de abril de 1976 em que o carro que dirigia, um Karmann-Ghia, capotou no túnel Dois Irmãos e despencou na ladeira da Estrada da Gávea, morrendo na hora — um acidente forjado pelo DOI-CODI carioca do achocolatado general Leônidas, conforme denúncia do ex-delegado Cláudio Guerra. Uma semana antes do acidente, Zuzu deixara na casa do compositor Chico Buarque de Holanda um documento em que escreveu:. “Se eu aparecer morta, por acidente ou outro meio, terá sido obra dos assassinos do meu amado filho”.

A nostalgia de 1964
Quando essas coisas sinistras aconteceram, o general Leônidas era o chefe imediato da central de repressão mais ativa e bem informada do Rio de Janeiro. Mas as cenas estranhas que atormentavam a cidade e a alma brasileira pareciam não dizer respeito ao chefe do Estado-Maior a que se subordinava o DOI-CODI, que o general Leônidas garantia estar subitamente domado em sua pacífica administração. Os desaparecimentos que teimavam em acontecer nas redondezas e nos porões, aparentemente, não quebravam a imaculada mansidão de seu comando: “Desafio, desafiei lá e desafio agora alguém que tenha sido torturado, ou tenha sofrido qualquer restrição maior do que as técnicas nos prometiam, que era o isolamento”, repete Leônidas.
O general e a ‘Chacina da Lapa’: “Pagamos pela delação da cúpula do PCdoB”

O general não nega, com a vaidade previsível, a responsabilidade direta pela chamada “Chacina da Lapa”, a morte da cúpula do PCdoB numa casa do bairro paulistano onde o partido se reunia em dezembro de 1976 para avaliar a guerrilha do Araguaia. A revelação nasceu no comando de Leônidas, que admitiu ter pago R$ 150 mil à filha de um ex-dirigente da organização, Manoel Jover Telles, para delatar o dia e o local do encontro. A operação de cerco e extermínio foi planejada na central de repressão da rua Barão de Mesquita pelo coronel Freddie Perdigão, chefe da Agência Rio do SNI e braço executor (lato sensu) do DOI-CODI, conforme denuncia o ex-delegado Guerra. “Pagamos aos presos para eles delatarem os outros”, explicou-se o general Leônidas, com a convicção do soldado dedicado ao exercício cívico da violência. Ele não se arrepende do que enfrentou: “Guerra é guerra”, disse na Globo News. “Guerra não tem nada de bonito — só a vitória. E nós tivemos. A vitória foi nossa. Porque este país caiu na democracia que nós queríamos”.
Agora, assustado com a aparição da Comissão da Verdade que ameaça dissecar a ‘democracia’ e o ciclo de violência em que caiu o país que queriam os militares em 1964, o general Leônidas ameaça resistir à pressão da verdade com o surrado tacape do ‘poder moderador’. Alguém precisa avisar ao veterano golpista dos idos de 64 que a democracia brasileira já não teme cara feia, nem se assusta com fantasmas do passado.
Mais consolador ainda seria ouvir dele um educado e cabal pedido de desculpas ao país pela grosseria. Na sua idade, o velho e imoderado chefe militar não merece nada mais do que um chocolate. Por favor, general Leônidas, volte às pantufas!
* Luiz Cláudio Cunha é jornalista
[cunha.luizclaudio@gmail.com]


A lista dos 31 desaparecidos no Rio de Janeiro, segundo o Dossiê Ditadura — Mortos e Desaparecidos Políticos no Brasil 1964-1985, publicado em 2009:

  1. Antônio Joaquim Machado, 31 anos, desaparecido em 1971

  2. Armando Teixeira Frutuoso, 54, desaparecido em 30/8/1975

  3. Boanerges de Souza Massa, 34, desaparecido em 1972

  4. Caiupy Alves de Castro, 45, desaparecido em 21/11/1973

  5. Carlos Alberto Soares de Freitas, 32, desaparecido em 1971

  6. Celso Gilberto de Oliveira, 25, desaparecido em 10/12/1970

  7. Eduardo Collier Filho, 26, desaparecido em 23/2/1974

  8. Félix Escobar Sobrinho, 47, desaparecido em agosto de 1971

  9. Fernando Augusto Santa Cruz Oliveira, desaparecido em 1974

  10. Heleny Telles Ferreira Guariba, 30, desaparecida em 1971

  11. Honestino Monteiro Guimarães, 26, desaparecido em 1973

  12. Ísis Dias de Oliveira, 30, desaparecida em 1972

  13. Ivan Mota Dias, 28, desaparecido em 1971

  14. Jayme Amorim Miranda, 48, desaparecido em 1975

  15. Joaquim Pires Cerveira, 50, desaparecido em 1973

  16. Joel Vasconcelos Santos, 23, desaparecido em 1971

  17. Jorge Leal Gonçalves Pereira, 31, desaparecido em 1970

  18. Mariano Joaquim da Silva, 41, desaparecido em 1971

  19. Norberto Armando Habeger, 29, desaparecido em 1978

  20. Orlando da Silva Rosa Bonfim Júnior, 60, desaparecido em 1975

  21. Paulo César Botelho Massa, 26, desaparecido em 1972

  22. Paulo Costa Ribeiro Bastos, 27, desaparecido em 1972

  23. Paulo de Tarso Celestino da Silva, 27, desaparecido em 1971

  24. Ramires Maranhão do Vale, 22, desaparecido em 1973

  25. Rubens Beirodt Paiva, 41, desaparecido em 1971


  26. Sérgio Landulfo Furtado, 21, desaparecido em 1972

  27. Stuart Edgar Angel Jones, 26, desaparecido em 1971

  28. Thomaz Antônio da Silva Meirelles Neto, 36, desaparecido em 1974

  29. Umberto Albuquerque Câmara Neto, 26, desaparecido em 1973

  30. Vitorino Alves Moitinho, 24, desaparecido em 1973

  31. Walter Ribeiro Novaes, 31, desaparecido em 1971