domingo, 31 de maio de 2009

A Blogosfera da nossa direita



Campanha do blog coturno noturno contra a ministra Dilma 



O Blog Coturno Noturno é um dos blogs de direita em ação na blogosfera, afinal, a direita também tem seus militantes. Mas ao contrário dos blogs de esquerda (ou não de direita) as páginas dos reacionários são bem feinhas, quadradonas, de mal gosto. Essa gente tem certa dificuldade com a internet, território livre e democrático demais para eles. Também tem dificuldade com a verdade e com informação precisa, tanto que seus seguidores são em sua maioria um bando de confusos, sem uma noção clara do que é direita e esquerda, nem do que foi a ditadura. Vejam o exemplo abaixo, de uma seguidora atenta do Reinaldo Azevedo:

  1. Vera L. disse:

    Reinaldo semana passada vi o documentário do Simonal, aqueles tempos tão parecidos com o presente, Médice com alta popularidade, o Brasil Grande, parece Lula falando e o povo aplaudindo. O povo continua o mesmo, nem o cabelo mudou, naquele tempo aplaudia um ditador, hoje aplaude um VIGARISTA que deu boa vida para seus filhos, seu partido, banqueiros, seus amigos empresários, empreiteiros, corruptos fisiológicos. Pensar que artistas, jornalistas, esquerdistas, condenaram Simonal e hoje aplaudem esse governo. Verdade, o documentário é MUITO BOM, desmascara os salafrários e mostra quem foram os VERDADEIROS dedos-duro daquele tempo: Ziraldo, Jaguar, grande parte da imprensa e os ARTISTAS.


Chega ser ridículo, completa falta de noção, o Lula é igual ao Médici, então o FHC é igual o Salvador Allende? São um bando de confusos e pessimamente informados. Também, pelas fontes de informação que buscam... A direita não tem seriedade nem profissionalismo, vejam abaixo gadgets que se encontram nos blogs dos carcomidos, com informações imprecisas e caluniosas:



Charles Chandler, agente da CIA, que no dia de sua morte ia dar uma palestra sobre a guerra do Vietnã, apregoando a benesses que sua pátria patrocinava naquele distante país, foi morto por um comando que unia VPR e ALN. Dilma, como já disse Antonio Roberto Espinosa, pertencia a essa altura, 12/10/68, a uma organização que viria a se chamar COLINA (Comandos de Libertação Nacional), organização que se fundiria com a VPR apenas em setembro de 69, dando origem a VAR-PALMARES



Este militar foi morto por um comando liderado pelo capitão Lamarca, em maio de 1970. Quando houve a união entre Colina e VPR, uma parte da VPR não aderiu a fusão e não ingressou na VAR-PALMARES, formando uma nova VPR, ainda em setembro de 1969, portanto, o grupo de Dilma não tem qualquer envolvimento com a morte do ten. Mendes Junior



Esta explosão foi provocada, em 1966,  por uma ação isolada de um membro radical da AP (Ação Popular), grupo de esquerda católico, ação esta que foi condenada pela organização. Os membros mais radicais da AP posteriormente formariam a APML (Ação Popular Marxista Leninista) e uma outra parte iria aderir ao PC do B. Estes grupos sequer dialogavam com a VPR, com o COLINA, ou com a VAR, por discordâncias estratégicas e teóricas.


Este soldado foi morto por um comando sob ordens de Carlos Mariguella, no Ibirapuera, em junho de 68, mais de um ano antes da criação da VAR, a essa altura a Dilma sequer estava na clandestinidade.


Dilma Roussef pertenceu a VAR-PALMARES, era do setor de propaganda, voltada ao setor estudantil, era uma jovem bonita e sonhadora, bem diferente da imagem demoníaca que os imbecis da direita tentam passar a nossa classe média ignorante. É incrível como as informações desses blogueiros não tem preocupação alguma com a veracidade do que divulgam, mentem na cara dura e contam com a estupidez daqueles que os seguem, não respeitam a inteligência de seus leitores. Mas bom... se até  a mídia gorda anda fazendo isso, publicando spans na primeira página.   

sexta-feira, 29 de maio de 2009

Bolsonaro: a viúva que não foi

Deu no site da Revista Fórum

Bolsonaro faz troça com desaparecidos políticos

Por Redação [Quinta-Feira, 28 de Maio de 2009 às 13:31hs]

O deputado federal Jair Bolsonaro (PP-RJ) de novo desrespeitou as vítimas da ditadura militar. Um cartaz afixado no gabinete do parlamentar desde 2005, segundo sua assessoria, provocou a reação de congressistas de esquerda. Com os dizeres "quem procura osso é cachorro", a peça ironiza a busca de desaparecidos na guerrilha do Araguaia, organizada nos anos 1970.

 

A parlamentar Jô Moraes (PCdoB-MG) promete entrar com um processo no Conselho de Ética contra o deputado por falta de decoro. “É o cúmulo da falta manifestou-se o diretor de Comunicação Grupo Tortura Nunca Mais de São Paulo, Delson Plácido, em carta enviada ao Presidente da Câmara, deputado Michel Temer (PMDB-SP).

 

O deputado é notório pelas declarações estapafúrdias e grosseiras. Em agosto de 2008, ao sair de um evento, disse que o erro da ditadura foi "torturar e não matar" em um bate-boca com manifestantes.

 

No ano de 2005, em uma sessão solene na Câmara dos Deputados, o parlamentar homenageou militares que participaram da repressão à Guerrilha do Araguaia. Entre outras excrescências do seu discurso, se referiu à ministra Dilma Roussef, que foi presa e torturada, dizendo: “não falarei do seu passado particular nesta Casa. Se tentar reagir, exporemos seu passado. A tortura que V. Exa. sofre foi fruto de abstinências”. À época, não houve reações indignadas da grande imprensa, embora o fato tenha sido tema do editorial da Fórum.

Redação.


 Bolsonaro é uma das viúvas das ditadura, mas nem tão viuva assim, pelos seus insistentes depoimentos fica patente sua frustração em não ter desfrutado do sadismo das forças repressivas da ditadura brasileira (nada branda). Bolsonaro nasceu em 1955, em 64 tinha nove anos, não devia entender muito bem de política (se é que algum dia ele entendeu). Em 68 já tinha 14 anos, já dava para ter alguma noção (se é que algum dia ele teve isso), deve ter achado legal o AI-5, toda aquela repressão, aqueles moços de verde esparramados pela cidade. Certamente formou sua personalidade política nos anos de chumbo, devia admirar boquiaberto as instruções de tortura e sadismo na academia militar em que estudou, mas esse "prazer" ele não teria, a abertura se inicia em 78, e o jovem aspirante Bolsonaro não pode desfrutar a contento do Estado policial protofascista do AI-5. Na entrevista abaixo Bolsonaro diz que nunca matou ninguém, e é bem provável que seja verdade, nosso deputado tem toda pinta de cachorro raivoso que late mas não morde. É uma viúva frustrada, daquelas que enviuvaram antes de lua de mel, por isso reza dia e noite por uma nova ditadura, para tavez, assim, poder por em prática seu sadismo retórico. Contudo Bolsonaro é uma idéia fora do lugar, não há mais espaço em nossa sociedade para uma ditadura como a de 64, ao menos nos mesmos moldes. Bolsonaro banca o tigre sem nunca ter pertencido aos orgãos de repressão da ditadura. Banca o Charles Bronson sem nunca ter dado um tiro fora dos treinamentos do quartel. Banca o carioca marrento tendo nascido em Campinas. Bolsonaro é um meninão bobão portando uma pistola, ainda assim é bom estar vigilante com relação a um tipo desses, afinal ele teve mais de cem mil votos nas últimas eleições, cem mil pessoas comungam de suas idéias. Hitler, no começo de sua atividade política, era visto como um sujeito excêntrico, um palhaço, um fanático...

Entrevista: Jair Bolsonaro - ISTOÉ GENTE (?), Fev. 2000

"Eu defendo a tortura"
O deputado que defende fuzilamento de FHC ficou 28 anos sem falar com o pai alcoólatra

Cláudia Carneiro


Entre os companheiros de quartel no Rio de Janeiro, o capitão reservista do Exército Jair Messias Bolsonaro era conhecido como "cavalão". Seu porte atlético, em 1,86 metro de altura e 75 quilos, desenvolvido nos exercícios da Escola de Educação Física do Exército, garantiu-lhe o título de pentatleta das Forças Armadas. Mas foi a língua solta que o ajudou a ganhar fama nacional, quando começou a questionar governos, há mais de uma década, para defender a corporação à qual pertenceu. Nas últimas semanas, manteve o hábito de causar polêmica ao propor o fuzilamento do presidente Fernando Henrique Cardoso. No terceiro mandato federal, eleito com 103 mil votos, o deputado Jair Bolsonaro (PPB-RJ), 44 anos, abre fogo contra colegas da Câmara dos Deputados que combateram a ditadura militar, defende a tortura, a censura e a pena de morte e não se arrepende de ter pregado o fuzilamento do presidente. Pai de três filhos adolescentes com a primeira mulher, Rogéria Bolsonaro, e de um bebê com a segunda, Cristina, 32 anos, Bolsonaro revela em entrevista a Gente que sonha disputar a Prefeitura do Rio de Janeiro. "Mas eu não estou preocupado em ser prefeito. Eu quero é espaço."

Teme algum dia ser cassado por suas declarações?
Não. Se um soldado está na guerra e tem medo de morrer, é um covarde. Se eu fosse cassado, seria o parlamentar cortando seu próprio direito de opinião, palavra e voto. Tenho poucos inimigos dentro da Câmara.

Ainda acha que o presidente deveria ser fuzilado?
Eu não errei em falar isso naquele local, naquela oportunidade e naquele momento. E acho que tenho o direito de falar. Eu não xinguei o presidente, nem disse que ele não conhece o pai dele. Acho que o fuzilamento é uma coisa até honrosa para certas pessoas.

Isso não é incitação ao crime?
Se eu estivesse conspirando, não falaria isso. Não é difícil matar o presidente. Só tem que ter coragem. O esquema de segurança dele é falho. Por exemplo, tenho uma casa no litoral em Mambucabinha, próxima do local onde ele passeia quando vai a Angra dos Reis. Sou primeiro lugar no curso de mergulho do Corpo de Bombeiros do Rio de Janeiro. Bastava planejar. E as chances de sucesso de se cumprir a missão são grandes. Não é difícil eliminar uma autoridade no País. Isso até serve para alertar o presidente.

Como isso seria feito?
Tudo depende de planejamento. Pode-se pegar uma arma com mira e matar o presidente em Brasília. Com uma besta (espécie de arco e flecha) dá para eliminar uma pessoa a 200 metros. Até com um canivete dá para chegar no cangote do presidente. Mas quero deixar claro que não estou incitando ninguém a fazer. E não tenho nenhum plano para eliminar o presidente. Eu não partiria para uma missão suicida.

O senhor fuzilou alguém?
Não. Eu já saquei arma uma vez. Estava indo a pé para o quartel, no Rio, por volta da meia-noite, e vi que estava sendo perseguido. O elemento então saiu correndo. Devia ser um ladrão barato.

Seus colegas de Congresso o consideram uma pessoa truculenta. Como o senhor é em casa?
Nunca bati na ex-mulher. Mas já tive vontade de fuzilá-la várias vezes. Também nunca dei um tapa num filho. Gosto de chamar para conversar, contar piadas.

O que levou ao fim seu casamento de 19 anos?
Meu primeiro relacionamento despencou depois que elegi a senhora Rogéria Bolsonaro vereadora, em 1992. Ela era uma dona-de-casa. Por minha causa, teve 7 mil votos na eleição. Acertamos um compromisso. Nas questões polêmicas, ela deveria ligar para o meu celular para decidir o voto dela. Mas começou a freqüentar o plenário e passou a ser influenciada pelos outros vereadores.

Não era uma atitude impositiva de sua parte?
Foi um compromisso. Eu a elegi. Ela tinha que seguir minhas idéias. Acho que sempre fui muito paciente e ela não soube respeitar o poder e liberdade que lhe dei. Mas estou muito feliz na minha segunda relação. Vivo muito bem com a Cristina.

O que o senhor acha da legalização do topless?
Não sou contra, não. Desde que seja com a mulher dos outros. Depois que todas as mulheres estiverem usando, aí a minha poderá usar. O fio dental foi um escândalo e hoje é normal. Tudo é evolução.

E sobre a legalização do aborto? 
Tem de ser uma decisão do casal.

O senhor já viveu tal situação?
Já. Passei para a companheira. E a decisão dela foi manter. Está ali, ó. (Bolsonaro aponta para a foto no mural de seu filho mais novo, Jair Renan, de 1 ano e meio, com Cristina.)

O senhor segue alguma religião?
Eu acredito em Deus. Sou católico. Mas é coisa rara ir à Igreja. Eu já li a Bíblia inteirinha, com atenção. Levei uns sete anos para ler. Você tem bons exemplos ali. Está escrito: "A árvore que não der frutos, deve ser cortada e lançada ao fogo". Eu sou favorável à pena de morte.

Pena de morte é a solução?
Acho que um elemento que pratica um crime premeditado não pode ter direitos humanos. O José Gregori (secretário nacional dos Direitos Humanos) fala em indenizar os familiares dos 111 mortos no Carandiru. E ele não dá uma palavra às viúvas e órfãos que os 111 fizeram em sua vida de marginalidade.

A polícia agiu corretamente no Carandiru? 
Continuo achando que perdeu-se a oportunidade de matar mil lá dentro. Pena de morte deve ser aplicada para qualquer crime premeditado.

Isto inclui tráfico de droga?
Aí é outra história, aí eu defendo a tortura. A pena de morte vai inibir o crime. Nunca vi alguém executado na cadeira elétrica voltar a matar alguém. É um a menos.

Em que outras situações o senhor defende a tortura?
Um traficante que age nas ruas contra nossos filhos tem que ser colocado no pau-de-arara imediatamente. Não tem direitos humanos nesse caso. É pau-de-arara, porrada. Para seqüestrador, a mesma coisa. O objetivo é fazer o cara abrir a boca. O cara tem que ser arrebentado para abrir o bico.

E a tortura praticada pela ditadura militar? 
Admito que houve alguns abusos do regime militar, mas a tortura não foi em cima de um simples preso político. Aquelas pessoas estavam armadas e matavam. Só na Guerrilha do Araguaia perdemos 16 militares.

O senhor disse que o deputado José Genoino (PT-SP) era mentiroso e delatou seus companheiros da Guerrilha do Araguaia. O senhor tem provas?
Tenho informações seguras. Eu tenho orgulho de dizer que não fui um Genoino da vida, um deputado mariposa. O Genoino fala que pegou em armas por dois anos. O que ele fez nesses dois anos? Assaltou bancos, seqüestrou? Quantos ele matou?

O que pensa sobre a união civil entre pessoas do mesmo sexo?
Eu sou contra. Não posso admitir abrir a porta do meu apartamento e topar com um casal gay se despedindo com beijo na boca, e meu filho assistindo a isso.

Tem algum homossexual na família?
Graças a Deus, não. Eu desconheço. Se tivesse, nem quero pensar.

E como o senhor trata da liberação sexual com seus filhos?
Certas coisas não se pode ser contra ou a favor. Prefiro que um filho meu leve uma namoradinha para dentro de minha casa, num dia que eu não esteja lá, do que ele ser rendido na rua e assassinado dentro de um carro.

Como foi que o senhor perdeu a virgindade?
Com 17 anos de idade. Meio tarde, né? Meus filhos vão pegar no meu pé por causa disso. Eu estava na Escola Preparatória de Cadetes do Exército, em Campinas. Ninguém tinha dinheiro. Juntávamos uns 20 alunos, fazíamos um sorteio, íamos para o baixo meretrício e os cinco sorteados faziam fila com a mesma mulher.

Seu pai era agressivo em casa?
Eu não conversava com ele (Percy Geraldo Bolsonaro, morto em 1995) até os 28 anos de idade. Ele bebia descaradamente e brigava muito em casa, com minha mãe e os filhos. Mas nunca bateu em filho. Um dia constatei que não iria mudá-lo. Resolvi pagar uma pinga para ele. Nos tornamos grandes amigos.

Por que decidiu ser militar?
Por causa do Lamarca. Eu tinha 15 anos de idade, usava cabelo com gumex, calça boca-de-sino, sapato "cavalo de aço", quando o Lamarca passou por Eldorado Paulista, em 1970. O Exército chegou lá. Eu então conheci e me apaixonei pelo Exército brasileiro.

Pretende disputar nova eleição para a Câmara?
Tenho que ficar com os cabelos mais brancos para um dia tentar um cargo no Executivo. Na Prefeitura do Rio de Janeiro, para eu fazer meu nome. Daí, quando perguntarem sobre enchente num debate, eu vou responder sobre reservas indígenas. Não estou preocupado em ser prefeito, eu quero espaço, quero mostrar o que a mídia não mostra.


Em nota: Jair Bolsonaro é da mesma estirpe que o Reinaldo de Azevedo e o Diogo Mainard, todo mundo ta careca de saber que essa gente vai votar no Zé Pedágio, um motivo a mais pra não votar no vampiro, vá de retro Satanás!


 

 Serra 2010

 

quinta-feira, 28 de maio de 2009

O mais novo membro da bancada ruralista: Aldo Rebelo

  

Aldo Rebelo, que se dizia maoísta, modelo revolucionário que privilegiava a ação camponesa,  agora se esforça para defender os interesses das classes latifundiárias, se fosse na China da revolução cultural... Nosso ex-esquerdista conta tudo no Estadão, e por incrível que pareça, até o jornalista do Bravo Matutino se mostrou mais solidário aos índios brasileiros que nosso camarada, ex-presidente de UNE, ex-maoísta, ex-comunista, ex...  




Íntegra da entrevista de Aldo Rebelo sobre a questão indígena


Roldão Arruda, de O Estado de S. Paulo

domingo, 24 de maio de 2009,


SÃO PAULO - O deputado Aldo Rebelo (PC do B) recebeu o repórter em seu escritório político, em São Paulo. Um escritório modestíssimo, para dizer o mínimo, num edifício também modestíssimo, na Rua Augusta.

A conversa durou pouco mais de uma hora. Mas poderia ter ido muito além: Aldo adora falar sobre a questão indígena, a história do Brasil, os grandes temais nacionais.


O foco foi o projeto que ele apresentou recentemente na Câmar dos Deputados, em parceira com Ibsen Pinheiro (PMDB-RS), propondo alterações na forma como são feitas as demarcações de terras indígenas.

De acordo com o PL 4791/2009, toda vez que o Executivo quiser demarcar alguma terra indígena, terá que submeter o projeto ao Congresso.

É uma proposta que provoca arrepios em organizações de apoio aos índios. Para elas, se a proposta de Aldo e Ibsen for aprovada, qualquer projeto de demarcação estará fadado ao fracasso, pois a banc ada ruralista, uma das mais poderosas do Congresso, tratará de barrá-lo.

Um dos lados mais curiosos dessa história é que o projeto aproxima o deputado de um partido comunista, com tradição socializante, de grupos conservadores, que contestam. Na entrevista abaixo, transcrita parcialmente na edição desta segunda-feira no Estado, o deputado explica suas razões. 

Começa dizendo que os índios brasileiros nunca são ouvidos pelas autoridades nos processos de demarcação; que eles são baseados em laudos antropológicos nem sempre confiáveis e sob pressão de organizações não-governamentais que insistem em tutelar os índios e apontar o Estado como ameaça à sua cultura. No conjunto isso estimularia propostas secessionistas e põe em risco a integridade territorial do Brasil.

Aldo é alagoano e tem 53 anos. Começou sua carreira política no movimento estudantil e chegou a presidir a União Nacional dos Estudantes, na época de sua reconstruç ão, nos anos 80. Já foi eleito cinco vezes consecutivas para o cargo de deputado federal e é considerado um dos parlamentares mais influentes do Congresso. Também já ocupou as cadeiras de presidente da Câmara e de ministro da Articulação Política do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

 

O que o levou a apresentar esse projeto, que transfere as demarcações do Executivo para o Legislativo?

O projeto não subtrai do Executivo a prerrogativa de demarcação das terras indígenas. Apenas obriga o Executivo a enviar a proposta de demarcação ao Congresso, que analisa, promove as discussões, as negociações necessárias com as partes envolvidas no processo demarcatório. E depois disso a proposta é devolvida ao Executivo, na forma original ou modificada. É uma instância de negociação voltada para todas as partes envolvidas e interessadas, incluindo os índios, que não são ouvidos no processo demarcatório - uma decisão unilateral da Funai (Fundação Nacional do Índio), que colhe o laudo - nem sempre rigoroso - de antropólogos e submete ao Ministério da Justiça, que prepara o decreto de demarcação e encaminha ao presidente da República, que homologa. O projeto democratiza o processo de demarcação.

O senhor está mesmo dizendo que o governo não ouve os índios?

Não ouve. O caso da Raposa Serra do Sol é patente. Ali, um grupo grande de indígenas contestou a demarcação proposta pela Funai. No entanto não foi levado em conta.

A maioria dos índios era favorável à demarcação em área contínua.

Não creio. Pelo que apurei, em visitas àquela região, não havia maioria favorável. A relação entre os grupos de índios que vivem ali não é das mais amistosas e eles preferiam que a demarcação fosse em ilhas, onde cada tribo teria sua área demarcada, sem precisar conviver co m outras. Isso não seria apenas por conta de rivalidades. Isso também levava em conta as diferenças no estágio de evolução de cada grupo. Em Roraima existem indígenas que estão num estágio ainda próximo da coleta, da caça, e outros que são formados por pequenos fazendeiros, comerciantes. É o caso dos macuxis.

Essa ausência de consulta aos índios foi específica do processo de Roraima? Ou ocorre também em outras processos?

Em todos os processos. No caso da Raposa Serra do Sol, o ministro que assinou o decreto de demarcação das terras, no governo de Fernando Henrique, sequer foi a Roraima. Não esteve lá nem uma vez. Ele assinou um decreto, impôs uma decisão a uma comunidade formada por índios e não-índios e, no fim das contas, ninguém foi ouvido.

O senhor falou que os laudos antropológicos que norteiam as demarcações nem sempre são rigorosos.

Ainda usando o exemplo da Raposa Serra do Sol, o laudo que deu origem àquela terra indígena é eivado de fraudes. As mais diversas. Há fraude no censo que contabilizou a população indígena, na coleta de testemunhas, na contabilidade das malocas usadas como referência para a demarcação. Malocas localizadas na Guiana foram contabilizadas como se estivessem no Brasil. Com isso você amplia a extensão da área a ser demarcada. Houve também a redistribuição dos índios: você encontra os índios concentrados num lugar e os subdivide por várias regiões, para poder ampliar a área demarcada. Tudo isso foi apurado e demonstra que é preciso uma autoridade que faça a mediação, a apuração, para que não se cometa injustiças.

Falando em mediação, acha que os arrozeiros poderiam ter ficado na terra indígena?

Mas é evidente que sim. Já vi de tudo na vida. Já vi entrarem numa propriedade para desapropriá-la e trocá-la de mãos, como faz o socialismo , como fez Fidel Castro em Cuba. Ele pegou aquelas usinas, aqueles canaviais e mudou de propriedade. Mas destruir, imobilizar a capacidade produtiva, isso eu nunca vi. A área de arroz era insignificante em relação ao conjunto territorial da Raposa Serra do Sol e constituía uma atividade econômica importante naquele Estado.

Em Roraima a classe média depende do emprego público e os pobres dependem da Bolsa-Família. Mais da metade da população de Boa Vista está no Bolsa-Família. Você não tem atividade econômica por ali. Importam até farinha de mandioca. Eu tentei tomar uma dose de cachaça em Roraima, uma caipirinha, e vi que ali não existem alambiques para produzir cachaça.

Como é possível numa situação dessas transformar em crime a produção de arroz? Crime é contrabando. É narcotráfico. Qual é a razão para a proibição do cultivo de arroz? Vai proibir porque os arrozeiros são conservadores, de direita? Então vamos dizer que no Brasil só pode produzir quem é de esquerda?

Deputado, os arrozeiros não tinham títulos de propriedade das terras.

Isso podia ser resolvido. Era só chegar nos arrozeiros e estabelecer um preço para eles, dizer que a terra ia custar tanto. Aliás, porque os próprios índios não podiam arrendar aquelas terras, obter algum tipo de benefício dali? Os arrozeiros ficariam ali pagando alguma renda.

Por que isso não aconteceu?

Porque não querem que os índios tenham essa lucratividade. Querem que ele continue tutelado, como um integrante da fauna da região. Os índios não podem explorar a madeira, não podem explorar os minérios. O Estado poderia ajudá-los nessas atividades, mas tudo continua imobilizado.

Existem situações assim em outros países. No Canadá os índios fizeram acordos com grandes empresas para a exploração do petróleo em suas terras. Os índios americanos tam bém têm fontes de renda.

O PIB dos índios americanos é de 25 bilhões de dólares por ano. Milhares de índios tem fortunas acima de 1 milhão de dólares nos Estados Unidos. Mas isso decorre de um processo de integração. Não é a segregação, que mantém os índios em determinado estágio, para que as pessoas possam produzir suas teses de mestrado e doutoramento.

O senhor defende o seu projeto dizendo que é necessário mais mediação, mais negociação nos processos de demarcação das terras indígenas. Mas o processo da Raposa Serra do Sol levou mais de trinta anos. Será que não houve chance de todas as partes se manifestarem nesse período?

Houve chance de sobra. O que não houve foi interesse. 

Afirma-se que, se o seu projeto for aprovado, não haverá mais demarcação de terras indígenas: todas as iniciativas serão barradas pela poderosa bancada ruralista do Congresso. 

Acredito que o Congresso vai agir como tem agido, considerando em primeiro lugar a defesa da população indígena. Tudo que está sendo feito hoje decorre de uma autorização do Congresso - o Congresso Constituinte, que incluiu na Constituição a garantia e a defesa dos direitos indígenas. É com esse espírito que eu acho que as áreas devam ser demarcadas.

Em primeiro lugar está a proteção do índio, o reconhecimento da dívida que o País tem com as populações indígenas. É a maior dívida social que nós temos. Em segundo lugar está o sentimento de gratidão, pelo legado indígena à formação do nosso povo e do nosso País. Já se disse que o Brasil é como um grande rio, alimentado por três grandes afluentes na formação do nosso povo, o afluente indígena, o europeu e o africano. Desses três o que precisa de maior proteção é justamente o afluente indígena. É obrigação da sociedade nacional e do Estado brasileiro proteger as pop ulações indígenas. Mas proteger não significa segregar, não significa construir uma barragem para impedir que esse rio importante alimente a formação do nosso povo, da nossa cultura.

Eles sofrem de fato ameaças na sobrevivência física e na sobrevivência de suas culturas - daí a necessidade de demarcar suas terras, protegê-los. Mas ao mesmo tempo há necessidade de integrá-los; e não de estimular qualquer sentimento secessionista. Acho isso inaceitável.

O senhor acha que os antropólogos que trabalham com as comunidades indígenas estimulam sentimentos secessionistas?

A antropologia, um ramo das ciências sociais, foi muito desenvolvida no auge do império britânico. A primeira sociedade antropológica surgiu na Inglaterra. O império estimulava, porque por meio da ciência conhecia melhor os povos a serem subjugados. Em seus primeiros momentos, a antropologia procurava convencer os chamados povos tribais, na África e em outros continentes, a se submeterem aos padrões da sociedade ocidental, porque isso interessava à afirmação do domínio britânico.

Quando os impérios coloniais se desintegraram e essas sociedades tribais passaram a integrar embriões de Estados nacionais, a antropologia passou a aconselhá-los a permanecerem em seu estágio tribal, afirmando que os Estados nacionais eram uma ameaça para eles. Deviam, portanto, formar Estados nacionais próprios e contestar a política de integração.

E é isso que, em resumo, vejo acontecer hoje no Brasil. Dizem para os índios: continuem no seu estágio, o Estado nacional ameaça a vocês.

Eu acho que não há futuro para essas populações fora do Estado nacional brasileiro. O que os índios vão fazer? O que vão constituir? Pequenos Estados? Frágeis? Estados fantoches?

É preciso administrar os conflitos dessas sociedades, dessas populações, dentro do Estado nacional. 

Pelo que diz, existe uma ameaça à segurança nacional.

No ano 2000, Orlando Villas-Boas, sertanista que dedicou a vida aos indígenas brasileiros, deu um depoimento a uma emissora de TV, hoje acessível pela internet, no qual fez uma advertência que é quase uma profecia. Disse que jovens ianomamis estavam sendo levados para os Estados Unidos, onde iam ser treinados, onde iam aprender inglês. Depois retornariam ao Brasil para pedir a criação de um território próprio, um Estado. Nesse momento receberiam a proteção da ONU, que transferiria a tutela dessa população a uma grande nação. Ele disse que talvez não vivesse para ver isso, mas fez a advertência. Ele dizia: 'Eles não estão interessados nos ianomamis, mas nas riquezas que há no subsolo dessa região da Amazônia e, principalmente, de Roraima."

Não acha isso fantasioso?

Não. O Brasil já viveu isso em diversos episódios. Um deles ocorreu ali mesmo, em Roraima. No início do século 20 o Brasil perdeu para a Inglaterra 20 mil quilômetros quadrados do antigo Território de Roraima, em área consagrada, em fronteira já marcada como parte do território brasileiro. Inicialmente a Inglaterra enviou uma missão geográfica à região. Depois apareceu uma missão religiosa, que catequizou os índios, que, por sua vez, pediram a proteção da Inglaterra. Foi aí que os ingleses impuseram o estado de litígio sobre uma área de 40 mil quilômetros quadrados. Estamos falando, como já disse, de um episódio ocorrido no século 20, numa área já demarcada como parte integrante do território brasileiro.

O caso foi submetido à arbitragem do rei da Itália, que dividiu o que era nosso: deu 20 mil quilômetros para a Inglaterra e deixou outros 20 mil para o Brasil.

Os ingleses queriam ter acesso à Bacia do Rio Negro, descendo por um dos seus afluentes. O maior rio da Guiana nasce nas serras que fazem fronteira com o Brasil, mas corre para o norte, em direção ao Caribe.

O território brasileiro sempre foi cobiçado. Nós tivemos também o caso da Bolívia, que tentou vender o Território do Acre aos Estados Unidos.

Os americanos chegaram a enviar uma canhoneira, que invadiu clandestinamente a Bacia do Rio Amazonas. Ela chegou a Manaus e saiu de lá com as luzes apagadas para não ser percebida. Seu capitão, com medo de se perder, recrutou dois práticos amazonenses e entregou a eles a direção do barco. Como não podia fazer isso com estrangeiros, tratou antes de conferir aos dois a nacionalidade americana. Isso foi em 1899, já pertinho do século 20, no auge do conflito por aquela área.


O Brasil não queria o Acre, desestimulou a ação dos seringueiros, que resistiam à ideia de deixar a área, e até mandou uma missão para dizer que se tratava de território boliviano.

O Brasil só mudou de posição quando percebeu a campanha na Bolívia para transferir o Território d o Acre para os Estados Unidos, por meio de uma empresa colonial. O cônsul dos Estados Unidos em Belém já estava articulado a transferência quando essa canhoneira entrou na Bacia do Amazonas.

A Bélgica também tentou ocupar uma área no território do Mato Grosso. Temos uma capital de Estado, São Luís, no Maranhão, que foi batizada em homenagem ao rei da França. Os holandeses ficaram algumas décadas no Nordeste. Há razões de sobra para acreditar que a cobiça continua. Pode não ser uma coisa para hoje. Mas continua.

O Brasil é signatário de convenções internacionais que tratam da questão indígena, procurando sobretudo proteger essas populações. O senhor acha que podem constituir risco para a segurança nacional?

Sim. As convenções constituem uma ameaça. Principalmente a convenção da ONU que reconhece a soberania das populações indígenas. O Brasil deve ouvir os índios, que hoje não são ouvidos por ning uém. Nem pelas ONGs, que exercem uma espécie de tutela sobre os índios, nem pelo Estado. Aliás, se você examinar a resolução do Supremo Tribunal Federal, que confirmou a demarcação da Raposa Serra do Sol, verá o seguinte: a pretexto de demarcar uma área contínua, o que era uma reivindicação das ONGs, a resolução retirou qualquer tipo de atribuição dos índios. Essa resolução também não é boa. Não serve ao processo de integração dos índios na sociedade brasileira.

Como vê a ação das ONGs?

O problema das ONGs é que veem os índios como se fossem instrumentos para estudos de caso de antropologia. Os índios dentro da reserva tem quase o status de uma cutia, uma paca, um bicho. Ele não têm direitos. São duplamente tutelados, pelas ONGs e pelo Estado.

Os índios precisam ter direitos dentro de suas reservas. Hojes eles não têm nem mesmo como sobreviver. Já encontramos vereadores e prefeitos indígenas, mas que atribuições eles podem ter? Que tipo de liberdade os índios têm dentro de suas reservas? Nenhuma. As pessoas não ouvem os índios.

Vê diferenças entre a atuação das ONGs nacionais e internacionais?

Não há nenhuma diferença. Elas estão imbricadas. As ONGs nacionais são subsidiadas pelo dinheiro estrangeiro. Uma vez visitei uma área ianomami e ali fui recebido numa maloca por uma moça de uma ONG chamada Urihi. Cheguei acompanhado pelo comandante militar da região, generais, coronéis, mas eles não puderam entrar. Foram impedidos. Eu entrei porque era deputado.

Na conversa com a moça, reclamei das condições da vida dos índios, condições insalubres, com taxas elevadas de doenças infecciosas, casos de tuberculose, subnutrição. Sugeri que fossem instalados na aldeia sistemas de fornecimento de água e de luz por ali. Mas a moça contestou, dizendo que isso iria transformar a cultura ianomami.

O ambiente era triste, depressivo. Só vi um pouco de alegria nos meninos, que jogavam futebol. Depois eu soube que essa Urihi tomou muito dinheiro do governo, em convênios, e simplesmente desapareceu, sem prestar contas. Isso ocorre porque ninguém fiscaliza, porque a legislação não prevê a fiscalização do dinheiro público que vai para as ONGs, na forma de repasses. 

É claro que também existem ONGs que de fato prestam ajuda, que são verdadeiramente humanitárias.

Organizações envolvidas com questões indígenas dizem que a prioridade do Congresso deveria ser a votação do Estatuto do Índio, que há muito tempo está parado por lá.

Veja isso: de um lado acham que o Congresso não é confiável, mas de outro querem que ele vote o Estatuto. Não estariam pedindo isso se achassem que o Estatuto pudesse representar um retrocesso.

Nós devemos votar o Estatuto, demarcar as áreas indígenas, assegurar os direitos indígenas, gara ntir a presença do Estado no meio deles. Nós temos uma Sub-Funai terceirizada, que praticamente entrega às ONGs a administração da assistência aos índios. Queremos uma Funai forte, com uma política própria, que reconheça as dificuldades dessas populações. Como a sociedade deve se comportar diante do índio? Segregando ou integrando? Eu defendo a integração.

Como vê as cotas em instituições públicas para os índios?

Eu sou contra as cotas raciais. Mas no caso dos índios acho que deve haver uma política de cotas. Acho lamentável perceber, nos pelotões que protegem a fronteira brasileira, que não contam com nenhum oficial indígena. Eles compõem o grosso da tropa, mas não chegam ao oficialato. É preciso uma política própria para que isso ocorra, uma política que reconheça as dificuldades dessas populações e que abra caminhos , exceções.

O senhor fala muito em integração. Acha que essa política deve servir mesmo para os índios isolados, sem contato com outras culturas, como os que vivem na fronteira do Brasil com o Peru?

A nossa política sempre foi de fazer contatos. Como é que o Estado vai prestar assistência a esses índios? Como vai levar assistência médica? Esses índios têm direito à alfabetização, a boas escolas. A política do Brasil sempre foi de fazer contato, respeitando esses povos. Não é o contato para desalojá-los. Não é o contato para romper, mas sim, para que recebam do Estado e façam suas escolhas.

Essa política de integração obedece e respeita os diversos estágios das diversas populações indígenas. Existe uma forma de integração para aquelas que se encontram no estágio tribal, vivendo da caça, da coleta; e outra forma para as que estão no estágio de integração mais avançado. Conheci no município de Uiramutã, em Roraima, um vereador macuxi que é professor de química, física, mat emática. Todo ano a Universidade Federal de Roraima festeja a formatura de turmas indígenas. Isso está certo ou errado? Eu acho certo.

Uma das situações mais trágicas verificada entre os povos indígenas, neste momento, é dos guaranis caiuás, do Mato Grosso do Sul. Eles estão concentrados em pequenas áreas, impossibilitados de manter sua cultura, sua forma de organização social, que ocorre por meio de clãs familiares. O nível de suicídio entre jovens é elevado, assim como os índices de alcoolismo, de subnutrição infantil. A situação é agravada pelo fato de serem hostilizados pela população local, que tenta impedir os trabalhos de antropólogos e técnicos para a demarcação das terras. Como acha que se pode resolver essa situação?

Temos guaranis também aqui em São Paulo, em duas reservas, em Parelheiros, na Zona Sul, e no Pico do Jaraguá, na Zona Norte. Elas dependem da ajuda da Prefeitura, que oferece a as sistência básica, com escolas, cesta básica. Não vejo muito interesse das ONGs por essas populações. Elas também reivindicam a ampliação das áreas em que vivem, mas as possibilidades são limitadas, porque estão cercadas por florestas e áreas urbanas, já ocupadas.

Sobre a questão do Mato Grosso do Sul, não tenho informações completas. Mas creio que deve ser demarcada uma área maior para os índios. Desde que sejam levados em conta também os interesses da comunidades de agricultores que ali vive.

Qual seria a área suficiente para esses índios? Como o governo pode adquirir? Se aquela área é fundamental para as populações indígenas, se eles não podem ser deslocados daquela área, quem pode ser? Mediante que tipo de acordo? Ainda existe uma área de fronteira agrícola muito vasta naquela região e é possível encontrar alternativas para quem planta soja e cria gado. Só que isso tem que ser mediado. A solução existe. O que imobiliza é a atitude unilateral, de tentar resolver sem negociar.

Embora pertença a um partido comunista, de esquerda, suas propostas batem com as de grupos mais conservadores, à direita do espectro político. Não sente receio de ser identificado com esses grupos?

Não. Minha posição ao longo da vida sempre foi em defesa da democracia, do socialismo e do Brasil. Acho que a base para a construção de uma sociedade avançada no mundo de hoje é o seu país. Quem viaja pelo mundo pode ver que, apesar do discurso da globalização, o espaço das pessoas ainda é o espaço do país.

Fiquei muito marcado pela leitura do romance 'Questão de Honra' do paranaense Domingos Pellegrini Jr, que é uma releitura da Guerra do Paraguai e da Retirada de Laguna. Muito bonito. O personagem principal é um oficial que acompanha o Taunay e reconta a história a partir de uma posição muito crítica.

Taunay era um militar enquadra do, para quem tudo estava certo; enquanto o outro sempre tinha críticas. Mas, no fim, já velho, ela acaba dando razão ao Taunay, reconhecendo que o que estava em jogo era a defesa do País.

Nós temos que defender nosso País. É a base comum de todo mundo. Qualquer projeto transformador tem como origem e como base a existência de um país. Ele deve proteger o que se conseguiu até hoje: o território, certo estágio de desenvolvimento, a unidade, nossa forma de enfrentar os desequilíbrios, as desigualdades.

O senhor se inspira no Marechal Cândido Rondon?

Me inspiro no Rondon, me inspiro no Darcy Ribeiro, na história do Brasil. O índio no imaginário do Brasil é diferente do índio do imaginário dos Estados Unidos. A imagem do índio nos Estados Unidos é daquele índio cercando a diligência. O herói para eles é sempre aquele que mata o cacique, que dizima o maior número de índios. Em qualquer cidadezinha americana, quando você vê uma estátua, pode ter certeza: foi ele quem matou mais índios. Bufalo Bill fazia exibições em teatros de Nova York contando como tinha conseguido matar tantos índios.

O nosso imaginário é diferente. Nós cultivamos os heróis indígenas. Todos eles. Os que lutaram a favor dos portugueses, como Poty e Tibiriçá; os que lutaram contra, como Sepé-Tiaraju, Cunhambebe, Ajuricaba. Tivemos índios estadistas, com presença forte no rumo da política brasileira. Sem o acordo com Tibiriçá, os jesuítas não teriam conseguido se instalar em São Paulo. O Poty teve um papel importante na expulsão dos holandeses em Pernambuco e chegou a ser condecorado pela Coroa Portuguesa. 

Nossa tradição é essa. Nos misturamos com índios desde os bandeirantes. Nos Estados Unidos, as famílias que vinham da Inglaterra não se misturavam. Casavam entre eles, rezavam em suas igrejinhas de madeira.

Nós tivemos até uma corrente literária indianista. A obr a de um dos nossos grandes poetas, Gonçalves Dias, foi lastreada em dois grandes poemas épicos, Juca Pirama e Timbiras - traduzidos para o mundo inteiro. O romance Iracema, que Alfredo Bosi chama de obra-prima e Machado de Assis reconhece como obra mate da nossa literatura, é um ensaio romanceado da vida indígena no Brasil.

No Império, na época da luta pela independência de Portugal, nossos rebeldes trocavam o sobrenome de origem portuguesa pelo sobrenome indígena - como forma de demonstrar a ruptura. José Bonifácio defendia a integração das populações indígenas.

O senhor acha que a questão da demarcação de terras quilombolas tem relação com essa discussão sobre as terras indígenas?

Tem muita relação. Imagine o seguinte: qual País colocaria em risco a sua base de lançamento de foguetes, como estamos vendo acontecer com a Base de Alcântara, no Maranhão? Em algumas áreas a q uestão quilombola está provocando divisões no meio do povo, no meio dos pobres, das famílias. Há casos, no Piauí, no Ceará, em que os pobres brigam, porque chega dinheiro, luz e água para os quilombolas, enquanto, ao lado dali, famílias tão pobres quanto eles continuam sem água nem luz. Isso é uma coisa importada dos Estados Unidos. A política de segregação nunca foi política de Estado no Brasil.

 

Mas nós temos racismo.

 

Temos. E ele precisa ser combatido e denunciado. A melhor forma de fazer isso é valorizar ainda mais a herança negra e indígena no conjunto da sociedade brasileira. Mostrar que todos nós somos tributários dessa herança negra e indígena. Uma loira de olhas azuis, como a Vera Fischer, mesmo que não traga no sangue a herança africana e indígena, é uma mulata do ponto de vista cultural, da miscigenação que tivemos aqui. Isso é o mais importante: o que trazemos na cultura, na psicologia, na c ulinária, no jeito de perceber o mundo, na capacidade de respeitar o diferente.

 

Quando você segrega, você retira do nosso processo civilizatório o que ele tem mais humano, de mais avançado. Nossas mazelas estão aí.

 

Deputado, a rejeição dos índios em Roraima sempre foi tão forte que eles mesmos não gostavam de ser chamados de índios, assumindo o ponto de vista de quem os oprimia. Isso mudou no processo da luta pela demarcação de suas terras. Hoje muitos não querem ser apenas chamados de índios: exigem que seja feita referência ao seu povo de origem. Sou macuxi, dizem. Sou ingaricó, patamona... Isso não é bom?

 

Claro que é bom. O preconceito vai diminuindo em todas as áreas. Pega o caso do preconceito contra o nordestino, no Rio e em São Paulo. Ninguém te chama de negro na rua. Mas continuam te chamando de baiano e paraíba. No passado o preconceito era contra os italianos, chamados de carcamanos. Nenhuma fam lia ilustre de São Paulo queria que sua filha sequer pensasse em casar com um italianinho. Hoje o preconceito já mudou de lugar: em São Paulo, há descendentes de italianos que se acham melhores que brasileiros.

 

O índio sempre foi visto como bêbado e preguiçoso.

 

O índio nunca foi preguiçoso. Ele não estava adaptado à disciplina do trabalho, nem na escravidão nem no capitalismo. O Darcy Ribeiro diz que nós devemos a essa indisciplina indígena parte importante da nossa intolerância às coisas rígidas. Ela nos torna mais flexíveis e mais abertos.


quarta-feira, 27 de maio de 2009

A ditadura acabou... para os intelectuais

Deu no Último Segundo


SÃO PAULO - Um ônibus foi queimado e outros cinco depredados durante protesto realizado pelos moradores da comunidade Vila Reis, localizada na zona leste de São Paulo, na madrugada desta quarta-feira.

AE
Durante protesto, manifestantes queimaram um ônibus

O protesto foi motivado, segundo informações da Polícia Militar, pela morte de Sérgio dos Santos, encontrado enforcado dentro de uma cela depois de ser preso pela acusação de tráfico de drogas.

Ainda de acordo com a polícia, cerca de 150 manifestantes participaram do protesto. Testemunhas contaram que dois adultos em uma moto e um grupo de adolescentes a pé abordaram o cobrador, que faz a linha 2460 (Cemitério da Saudade /Parque Dom Pedro),  anunciaram um roubo e em seguida atearam fogo no veículo.

O cobrador, o motorista e a passageira que estavam dentro do ônibus conseguiram fugir correndo. Antes da chegada dos bombeiros, o fogo se alastrou por uma árvore, atingiu a guarita do ponto e uma casa em frente. O fiscal da cabine também conseguiu fugir.

"Tive de tirar o carro da garagem com medo de uma explosão", contou o correspondente bancário Fábio dos Santos, de 23 anos, um dos moradores da casa atingida pelas chamas. Segundo a São Paulo Transportes (SPTrans), outros cinco ônibus foram depredados, mas não houve vítimas em nenhuma das ações.

Depois de atearem fogo no ônibus, os manifestantes fizeram uma barricada na Avenida Maria Santana, montada com lixo e entulho incendiados, e lançaram vários coquetéis molotov na direção da PM.

Segundo policiais civis, um coquetel molotov também foi lançado contra o 63º DP. O artefato explodiu em um matagal na parte de trás da delegacia e não chegou a danificar o prédio nem a ferir ninguém. O protesto terminou às 2h30 com a chegada da Tropa de Choque da polícia, que dispersou os moradores.

Santos, de 39 anos e conhecido como Sapinho, foi preso por policiais militares na porta de casa, no final da tarde de terça-feira. Segundo a Polícia Militar (PM), com ele foram encontrados cocaína e R$ 270. Familiares do suspeito afirmaram que ele já teria passado dez anos na cadeia por roubo.

Levado a uma cela no 63º Distrito Policial (Vila Jacuí), Santos foi encontrado morto, segundo a polícia, enforcado com o cadarço do próprio sapato. Conforme a polícia, Santos teria cometido suicídio. Porém, os familiares e os moradores da comunidade não acreditaram na versão.


Não parece uma outra História




     Mas as semelhanças param por aí, pois o Wladimir Herzog era um grande jornalista e o sapinho apenas um ex-presidiário , essa máxima vale sobretudo numa sociedade excludente e elitista como a nossa. O que fica patente no "suicídio" de sapinho é a manutenção de uma velha prática, de vez em quando os torturadores exageram na dose e aí tem que apelar para esse velho subterfúgio, é possível que eles até tenham alguma terminilogia para essa medida, pois os militares adoram nomear suas práticas com códigos, como "dá um caldo nele", "alisa ele um pouco", "despacha o presunto", "aperta que ele geme", expressões que ultrapassaram os muros dos quartéis e das delegacias e se tornaram comuns em nossa  sociedade, até no jornalismo, principalmente o esportivo, repleto de ex-colaboradores da ditadura. 

     O fato é que a ditadura acabou para os intelectuais, para os jornalistas, para os estudantes (mesmo assim vira e mexe vemos estudantes tomando borrachada da polícia). Vá falar em democracia no Jardim Ângela, na Cidade Tiradentes, na Brasilândia, no Morro da Babilônia, na Baixada Fluminense, ou nas periferias de BH, de Salvador, de Porto Alegre. Nesses lugares prevalece a lei do pau, ou da bala, a tortura nunca deixou de ser praticada SISTEMATICAMENTE nas delegacias de nosso país, as execuções são diárias, nossa polícia é A QUE MAIS MATA NO MUNDO. Sapinho e só mais um, e de uns tempos para cá a violência tem aumentado. Porém nossas classes médias adoram esse tipo de polícia, Conte Lopes e Bolsonaros que o digam, adoram ver pobre sendo espancado, polícia invadindo favela, chacinas, cadeias super lotadas. "Bandido bom é bandido morto!" Quem nunca ouviu esse frase de algum tio velho e reacionário, que assiste diariamente ao programa do Datena, tiete da Rota, ou do BOP.

    Numa sociedade onde a propriedade vale mais que a vida humana isso é normal, o problema é quando os bandidos também incorporam essa lógica e passam a matar vitimas que se quer reagiram ao assalto. Aí vem toda aquela comoção orquestrada pela mídia, aí vem "queremos pena de morte"; "maioridade penal já! É todo um ciclo de violência, e geralmente quem paga são os inocentes. Nossa sociedade sempre foi violenta, mas depois de 64, e de 68, a expiral de violência se intensificou. Depois de 1988 adotamos um arremedo de democracia voltada a elita branca, e para os demais continuou a vigorar o AI-5. 

    Mil ossadas na vala comum de Perus, mas o grupo Tortura Nunca Mais se tranquliza pois algumas dezenas poderam ser reconhecidas pelos familiares dos desaparecidos políticos. MIL OSSADAS, mas os antepassados do sapinho não importam. Reparação para quem? Democracia para quem? 

    O que me alegra hoje em dia é ver que as comunidades começaram a reagir a selvageria da polícia, vide Paraisópolis, alguns dias atrás na Penha e agora novamente na Zona Leste, é o povão que agora começa a se levantar, espero que dentro em breve ele nos ensinem, a nós classes médias "progressistas", a como lutar por uma sociedade mais justa para TODOS!