Na Cisjordânia, submetida à lei militar, menores podem permanecer detidos por oito dias antes de serem levados a um tribunal militar. Foto de ISM-NC
Jerusalém – “Pai, ajude-me! Não deixe que me levem!”, gritou Ahmed Siyam, de 12 anos, enquanto cerca de 50 soldados e polícias israelitas fortemente armados o arrastavam, algemavam e vendavam os olhos. O garoto era acusado de atirar pedras. No mês passado, Ahmed foi tirado da cama às quatro horas da manhã pelas forças de segurança lideradas por agentes do Shin Bet, a agência de espionagem interna israelita.
Ahmed foi levado a uma esquadra em Jerusalém ocidental acusado de atirar pedras contra soldados e polícias israelitas durante confrontos com jovens palestinos no bairro de Silwan, em Jerusalém Oriental. Silwan transformou-se num ponto habitual de confrontos entre jovens palestinianos e colonos judeus, estes últimos apoiados por soldados de Israel.
Centenas de palestinianos foram expulsos das suas casas em Jerusalém oriental para dar lugar às colónias judias. Muitos lares foram destruídos e outras dezenas estão sob ameaça. Tudo isto viola o direito internacional. Quando os soldados chegaram pela primeira vez, o pai de Ahmed, Daoud, negou-se a abrir a porta e exigiu que fosse apresentada a ordem de detenção.
“Mas eles ameaçaram arrombar a porta. Perguntaram onde estava o meu filho e eu perguntei por que o procuravam. Mandaram que calasse a boca e atacaram-me”, contou Daoud à IPS. “Depois foram ao quarto de Ahmed e arrastaram-no para uma viatura policial. Não disseram para onde o levavam e fui impedido de o acompanhar”, acrescentou. “Na manhã seguinte, depois de diversos telefonemas, soube que estava no Complexo Ruso (uma esquadra de polícia). Quando cheguei lá, não me deixar ver o meu filho, e negaram mesmo que ele estivesse ali”, disse o pai. “Finalmente, após chamar o meu advogado, pude vê-lo várias horas depois. Estava muito traumatizado e a chorar”, recordou Daoud.
“Fiquei assustado. Não podia ver para onde íamos e as minhas mãos estavam fortemente algemadas atrás das costas. Na delegacia, negaram-me água quando disse que estava com sede, e quando pedi para ir à casa de banho deram-me pontapés. Interrogaram-me durante horas e acusaram-me de atirar pedras, o que neguei”, contou Ahmed à IPS. Duas semanas antes, o seu primo, Ali Siyam, de sete anos, fora preso em circunstâncias semelhantes e também acusado de atirar pedras. Quando o seu pai, Muhammad, tentou deter a dezena de uniformizados israelitas que queriam levar o seu filho, recebeu golpes na cabeça e precisou ser atendido num hospital.
A tia de Ali recebeu um tiro na perna com bala de borracha quando tentava intervir, e também precisou de assistência médica. Os pais de Ali não puderam acompanhar o filho à delegacia, e, quando foram ao Complexo Ruso, a polícia negou que o menino estivesse detido. Quando a advogada israelita de Ali, Lea Tzemel, tentou visitá-lo na cadeia, os guardas impediram-na e ela acabou detida. Depois de uma discussão, conseguiu ver o garoto, que foi libertado várias horas depois. Por sua vez, Ahmed foi colocado sob prisão domiciliar e impedido de ir à escola, enquanto a investigação policial prosseguir. Deve comparecer à justiça no próximo mês, acusado de atirar pedras.
A organização Defesa de Meninos e Meninas Internacional (DNI) informou que a polícia israelita abriu 1.267 processos penais contra menores palestinianos, entre Novembro de 2009 e Outubro de 2010, por atirarem pedras em Jerusalém oriental. Por sua vez, o grupo B’tselem informou que 31 deles eram de Silwan. “Desses meninos e meninas, 50% foram interrogados sem a presença dos pais ou de um advogado, e muitos foram ameaçados ou atacados”, disse à IPS Gerard Horton, advogado da DNI.
“Muitas dessas crianças receberam gritos, bofetadas e empurrões, às vezes receberam pontapés e apanharam durante os interrogatórios, sendo obrigadas a fazer declarações de duvidosa precisão. Alguns foram ameaçados com mais violência”, disse Horton. “Essas crianças foram tiradas das suas casas no meio da noite, muitas algemadas e vendadas. Foram interrogadas horas depois, quando já estavam traumatizadas e desorientadas, sem possibilidade de resistir à pressão”, acrescentou.
A situação de meninas e meninos palestinos na Cisjordânia é ainda pior, pois estão submetidos à lei militar. Menores podem permanecer detidos por oito dias antes de serem levados a um tribunal militar. “Tivemos um caso em que três crianças foram alvo de abusos, quando tinham as mãos atadas às costas e eram interrogadas por polícias israelitas num dos colonatos. Outras foram ameaçadas de terem as casas explodidas e várias receberam ameaça de serem violentadas”, disse Horton à IPS.
Mais de 25 crianças palestinianas foram presas em Silwan nas últimas semanas. Milad Ayyash, de 17 anos, foi morto em Maio por um guarda de segurança israelita que argumentou que o jovem estava envolvido em confrontos. No ano passado, foi divulgado um polémico vídeo mostrando um colono israelita de Silwan a dirigir o seu veículo deliberadamente contra um menino palestiniano, que supostamente atirava pedras. As imagens foram usadas pelo fabricante do carro como demonstração da sua resistência, o que causou indignação. A criança foi hospitalizada com fracturas e depois presa. Não foram apresentadas acusações contra o motorista.
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