Imperialismo sem limites
ODiario.info
Com um sorriso nos lábios e um estar de simpática descontracção, Barack Obama não só continuou e incentivou as guerras do Iraque e Afeganistão, como levou a guerra ao Paquistão e procura desesperadamente recuperar a América Latina como «pátio das traseiras» dos Estados Unidos. Neste texto, Bryan Brenes descreve-nos a ocupação militar da Costa Rica, acordada com o governo servil da presidente Chincilla, aprovada em votação do Congresso costarricense e os caminhos para a recuperação da soberania nacional.
Num acto inédito em toda a história nacional, o Congresso aprovou no passado dia 29 de Junho permitir a entrada de 46 navios armados das Forças Armadas dos Estados Unidos na costa costarricense [1]. Com os navios calcula-se que chegaram ao país cerca de 7 mil soldados norte-americanos, juntamente com mais 200 aviões, helicópteros e diferentes tipos de aeronaves de combate. Juntamente com a autorização de entrada dos navios, os legisladores autorizaram os militares norte-americanos a entrarem no território costarricense sem qualquer restrição, desfrutando ainda da imunidade que têm em solo estadunidense, isto com o suposto objectivo de «cumprir com a sua missão» e «participarem em trabalhos de ajuda humanitária».
No entanto, a realidade é que a entrda do exército de uma potência imperialista nos portos costarricenses corresponde a uma ingerência militar clara, como se viu anteriormente. Nem sequer nas décadas de 70 e 80 do século passado, quando radicais processos revolucionários agitavam a maior parte da América Central, o Exército norte-americano invadiu abertamente a costa costarricense.
Pode dizer-se, sem margem para dúvidas, que um dos sonhos mais desejados de Laura Chincilla do passado se tornou realidade: é que apesar da Presidente por volta de 2004 ter tentado meter esses mesmos navios de guerra ao mesmo tempo que a ILEA (Escola Internacional de Polícias para o Cumprimento da Lei) – no quadro da invasão norte-americana do Iraque – só seis anos depois é que estes barcos e os seus militares conseguiram entrar no país, além de que foi o Congresso e não o Poder Executivo que teve a última palavra para tão grave violação da soberania costarricense. Então, as pequenas mas combativas mobilizações universitárias e sindicais, bem como a fragmentação no seio das fileiras burguesas, impediram que se aprovasse no Congresso a instalação não só dos navios, mas também de uma reciclada Escola das Américas que estava no Panamá, desta vez com o nome de ILEA.
Vamos a ver se desta vez o movimento de massas repete a façanha, mas desta vez expulsando os ianques da costa costarricense. No entanto, isto só pode alcançar-se com a mais ampla mobilização das massas, e a solidariedade internacionalista dos nossos irmãos trabalhadores e oprimidos da América Latina e do mundo.
Uma clara ingerência militar com fins geoestratégicos
Apesar da ocupação militar das dcosta da Coata Rica ser inédita na história deste pequeno país, não acontece o mesmo com os restantes países da América central e do Caribe; estes, ao contrário, têm sido vítimas da ocupação dos marines norte-americanos e da instalação de bases militares. É o caso do Caribe, desde Cuba com Guantánamo até ao Haiti com as reiteradas incursões militares dos Estados Unidos durante praticamente todo o século XX, ou à parte ístmica que abrange a Nicarágua, as Honduras, El Salvador, a Guatemala e, especialmente, o Panamá.
Os códigos geopolíticos que sustentaram a ocupação – essencialmente norte-americana – variaram de acordo com os diferentes momentos históricos: desde a rivalidade dos Estados Unidos com a Inglaterra, as fricções com a União Soviética, até à necessidade de travar a ascensão das massas e os processos revolucionários que sacudiram a América Central durante a década de 70 e parte de 80 do século passado.
Em diferentes momentos os Estados Unidos defenderam como a região da América Central e do Caribe como parte da sua zona de influência, não tanto pelo seu tamanho ou pelos seus recursos naturais, mas pela sua importância geoestratégica: é não só a região mais próxima para o abastecimento militar das tropas norte-americanas, mas também a que oferece vantagens como vias de comunicação inter-oceânicas como o Canal do Panamá ou a rota do rio San Juan, que actualmente serve de limite entre a Costa Rica e a Nicarágua. No caso do Canal, por aí circula uma elevada percentagem das mercadorias necessárias ao abastecimento do mercado estadunidense e uma boa parte dos países latino-americanos.
Ainda que ao longo da história centro-americana e do Caribe a tónica tenha sido a da ocupação, a verdade é que durante a administração Obama esta tem-se vindo a redefinir, paralelamente ao reforço militar noutras partes do mundo. Recordamos que depois do catastrófico terramoto de Janeirop no Haiti, a Casa Branca ordenou o envio de mais 10 mil soldados para a ilha, não só como forma de contar as possíveis revoltas «da fome», mas também para começar a reconfigurar um dispositivo estratégico de controlo sobre a região do Caribe.
Ao mesmo tempo que a catástrofe e a ocupação se abatiam sobre o Haiti o imperialismo norte-americano instalava 7 novas bases militares na Colômbia e, como se fosse pouco, quatro bases mais no Panamá, tudo sob a desculpa de fins «humanitários», luta contra o narcotráfico e o «terrorismo». O mais recente caso de militarização viveu-o a fronteira dos Estados Unidos com o México onde, sob a farsa do combate ao narcotráfico, o imperialismo norte-americano enviou milhares de soldados para «perseguir os capos da droga».
A fortíssima ingerência militar nas águas costarricenses de pelo menos 7.000 soldados norte-americanos desenvolve-se no quadro deste fortíssimo dispositivo militar, com o pano de fundo de uma luta aberta da administração Obama pela recuperação completa do controlo do que considera o seu «pátio traseiro», tudo isto ao mesmo tempo que prossegue a escalada das tensões da nação imperialista com as potências regionais no Médio Oriente, como o Irão.
Tudo isto parece indicar que enquanto os Estados Unidos prosseguem a militarização da região da América Central e do Caribe e outras partes da América Latina, que apoia disfarçadamente golpes militares como o das Honduras em 209 e cria um dispositivo militar para travar as aspirações de certos países de se converterem em potências regionais (caso do Brasil), prepara-se para eventuais guerras regionais noutras zonas do mundo. É isto que sugere não só a desproporcionada militarização regional, como a visão global de conjunto que guia a acção da potência imperialista masi preponderante do planeta [2].
O imperialismo norte-americano poderá inclinar-se a utilizar – como em anteriores períodos históricos – os seus pontos de apoio na América Central e no Caribe não apenas para agressões regionais a países latino-americanos, mas igualmente como plataforma para agudizar a sua política de agressão contra países «longínquos» como o Irão, com quem as tensões já dispararam.
Nesta perspectiva a escandalosa e desproporcionada ocupação militar norte-americana da costarricenses não podem obedecer à luta contra o narcotráfico nem muito menos devido a causas humanitárias. No meio de tudo isto está o interesse da potência norte-americana em controlar apertadamente o conjunto da América Latina, e de utilizar como possível porta-aviões a região da América Central e do Caribe e as bases de países como a Colômbia, como sustentação da sua política externa noutras partes do planeta.
Os jogos Panamax 2010 e os exercícios militares da potência imperialista norte-americana
Esta política de cerco em volta do istmo centro-americano assume a sua expressão máxima nos jogos Panamax 2010, que se realizam há 7 anos, e em que, paulatinamente, se têm envolvido os exércitos de dezenas de países, não só latino-americanos como de outras regiões do mundo.
Sob a direcção da «polícia» panamenha e do exército dos Estados Unidos, os jogos simulam um «ataque terrorista» ao canal do Panamá, que é defendido pela acção de vários exércitos latino-americanos e alguns europeus, como o da Holanda.
A autorização para a entrada dos barcos de guerra e dos soldados ianques foi aprovada pelo Congresso graças ao bloco formado pelo Partido de Libertação Nacional (PLN), o Movimento Libertário (ML) e o Partido da Renovação Costarricense (RC). No outro lado estiveram a Frente ASmpla (FA), alguns deputados do Partido Acção Cidadâ (PAC) e o Partido da União Social Cristã
A FA, juntamente com Luis Fishman e o PAC, protagonizou a oposição à autorização de entrada dos navios de guerra, argumentando que tais veículos não faziam parte da «lista» dos acordos de patrulhamento conjunto entre os Estados Unidos e a Costa Rica, e que por isso mesmo a sua incursão era uma violação da soberania nacional. Noutras sessões, Fishman defendeu que o convénio que permite o patrulhamento conjunto já tinha expirado, pelo que não podiam entrar novos barcos em águas da Costa Rica.
Ainda que se oponham à entrada dos navios em águas nacionais, há que afirmar categoricamente que não é suficiente opor-se pelo «tamanho» dos barcos. É necessário deixar bem claro que as posições políticas centrais destes partidos de «oposição» – agora encabeçados pelo candidato presidencial «menos mau», Luís Fishman – são ambíguas, timoratas e fizeram por diversas vezes o jogo do imperialismo.
Não só não recusam a ingerência imperialista e os acordos que facilitam a penetração militar dos Estados Unidos com a desculpa do combate ao narcotráfico, como até aprovaram no Congresso leis pró imperialistas como a Lei Antiterrorista (2008) que, ao fim de contas, acabaram por os atar de pés e mãos, impedindo-os de enfrentar de forma consequente o aumento da ingerência imperialista em curso
A situação política nacional e a incursão militar
Se tivesse que definir a situação política nacional, teria que dizer que esta se caracteriza por estagnação a nível geral mas com tendência para a recomposição, tanto da mobilização como da organização do movimento operário e popular.
Depois da invasão do campus universitário da Universidade da Costa Rica (UCR), o movimento de massas tem vindo lentamente a recompor-se, experimentando desde então momentos de retrocesso mas também picos de mobilização. Os portuários entraram em cena protagonizando intensas jornadas de luta (SINTRAJAP), também os docentes (APSE, os trabalhadores municipais, do sector eléctrico (ICE), os camponeses pobres e, naturalmente, os estudantes (UCR).
Ao que parece o PLN e a Presidente Chincilla decidiram aproveitar a conjuntura de amolecimento para avançar ainda mais no seu ambicioso plano de militarizar a Costa Rica. É que não é esta a primeira medida que tomam este partido e a presidente, pois já acordaram em Abril integrar a Comissão de Segurança Centro-americana, em conjunto com a burguesia golpista hondurenha. Esta comissão não outro objectivo que não seja o «centro-americanizar» a Costa Rica até aos níveis de militarização e repressão que prevalecem noutros países da região.
Ainda que não se descarte uma intervenção dos marines na vida política nacional – o que seria complicado –, a verdade é que a ocupação está mais relacionada com fins geoestratégicos que com a situação de um pequeno país da América Central que são a sua maquinaria «democrática» e a sua polícia, até ao momento, parece ter demonstrado ser capaz de conter e limitar a luta de classes.
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