Ana Jimenez, de 27 anos, atua há 4 na rede pública estadual na cidade de São Paulo e não nega que já sabia que seu futuro seria difícil quando ingressou na faculdade de Geografia e decidiu dar aulas. A vontade de contribuir para diminuir as mazelas do mundo, porém, a motivou, diz ela. Hoje, em meio à dificuldade de comprar um imóvel, Ana sente certa frustração. “Uma manicure ganha R$ 20 reais por 1 hora e meia de trabalho. Eu ganho R$ 7,50. Não é desmerecer o trabalho da manicure, até porque uma das minhas tias é manicure, mas ela não fez faculdade”, conta. “Para o meu pai, todo o investimento na minha formação está sendo desperdiçado. Por ele eu não seria professora. Nenhum pai quer que seu filho seja professor”, afirma. Em São Paulo, o salário inicial para um professor da rede estadual com nível superior é R$ 1.438,33. É pouco, mas há situações ainda mais críticas em outros estados.
Em maio, Amanda Gurgel, de 29 anos, comoveu milhares de pessoas ao proferir um discurso diante de deputados do Rio Grande do Norte. A professora, formada em Letras, questionou se os parlamentares seriam capazes de viver com seu salário-base: R$ 930. E denunciou o descaso com a educação. O vídeo foi parar na internet e virou um sucesso. Meses depois, porém, Amanda diz que tudo continua igual para os professores potiguares. “A gente não quer ser milionário, só ter uma vida digna No Rio Grande do Norte nada mudou. Fizemos uma greve que durou 81 dias, nenhuma das nossas reivindicações foi atendida. Fomos humilhados mais uma vez”, conta.
Os baixos salários entre os professores não são novidade, mas, com a entrada em vigor da lei que estabelece um piso nacional para a categoria, este quadro deveria ter começado a se alterar. A lei foi promulgada em 2008 e questionada na Justiça. Ficou suspensa até abril deste ano, quando o Supremo Tribunal Federal sentenciou que o texto é constitucional. O piso nacional passou a ser de R$ 1.187,97 para professores de nível médio, aqueles que não cursaram Ensino Superior.
Mesmo com a determinação, porém, pouco mudou. A maioria dos estados ainda paga remuneração inferior ao piso estabelecido, segundo a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE). Os professores têm feito protestos e greves para reclamar da situação. Algumas já duram meses e para muitos alunos o reinício das aulas previsto para agosto será adiado.
No Rio de Janeiro, por exemplo, onde esses professores recebem R$ 650, a situação só deve se definir nesta quarta-feira (3), quando haverá uma assembleia. Eles estão parados desde 7 de junho. “O Governo defende que paga um salário proporcional ao piso, já que a nossa carga horária é de 22 horas e meia, mas nós queremos receber o valor estabelecido pela lei”, explica Sérgio Paulo Aurnheimer Filho, coordenador do sindicato dos profissionais de educação do Rio de Janeiro. Segundo ele, centenas deixam a rede estadual, atraídos por salários em redes municipais que pagam até o dobro.
“Os professores ficam só esperando a aprovação em outro concurso para saírem. Isso prejudica o desenvolvimento de projetos educativos de médio e longo prazo”, aponta Aurnheimer.
Em Minas Gerais, onde o salário-base é de R$ 396,89 por uma jornada de 24 horas semanais, valor inferior ao piso, mesmo proporcionalmente, a situação não é diferente. A greve, que começou em 8 de junho, não tem previsão para acabar de acordo com Beatriz Cerqueira, coordenadora-geral do sindicato dos profissionais de educação de Minas. “Existe uma lei, mas o Governo de Minas não fez nada para se adequar. Por isso fizemos uma greve. Dar aula é, para muitos, apenas uma atividade de passagem, algo que se faz enquanto não se encontra outro trabalho que pague melhor. E tudo isso afeta o processo educativo”, emenda.
Muitos professores arranjam outros empregos para complementar a renda. “Preparar uma boa aula demanda tempo e esse tempo não é integralmente pago. Ou seja, além de ganhar pouco o professor trabalha de graça quando quer oferecer algo legal para os alunos. É óbvio que quando você está cansada e desmotivada fica tudo mais difícil”, diz a professora Ana.
Para Heleno Araújo Filho, secretário para assuntos educacionais da CNTE, a falta de vínculos com a comunidade e as múltiplas jornadas prejudicam a qualidade da educação. “O piso foi um instrumento muito comemorado, mas foi muito descaracterizado graças a interpretações errôneas e à má vontade dos gestores”, comenta.
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