Vale a pena assistir Besouro, a proposta é comercial, o filme não é lá essas coisas, mas só a oportunidade de ver elementos da cultura afro mostrados sem preconceitos já vale o ingresso. Pra quem é praticante de capoeira também é uma ótima pedida, as cenas com jogos são sensacionais, os capoeiristas são de primeira. Os vilões, todos brancos, são apresentados de maneira realista, interpretados por ótimos atores. É muito interessante ver o tratamento dispensado aos negros do Recôncavo Baiano da década de vinte do século passado, deparamo-nos com cenas que continuam a ser praticadas diariamente em nossas periferias, mudou apenas o cenário, a jagunçagem continua a mesma. A diferença é que hoje em dia somos nós que pagamos o salário dos jagunços, que espezinham a vida da nossa gente. Mas o espírito de heróis como Besouro, Mestre Pastinha e Mestre Gato Preto estão vivos em nosso povo.
Viva mestre Besouro!
Salve!
Os primeiros minutos de Besouro são assustadores. O filme começa com uma cartela explicativa que situa o ano, o local e as circunstâncias dos acontecimentos que serão vistos, recurso típico de quem prefere a linguagem verbal à cinematográfica, ou de quem não acredita na força das imagens que apresentará. Pior: a cartela, além de escrita, é redundantemente narrada. E o besouro digital que justificará (mais uma vez com uma desnecessária narração em off) o título do filme/ personagem parece aquela vinheta do CQC.
Quando abre a imagem, mais texto: “Salvador, janeiro de 1924”. Que era Salvador, e que era 1924, já sabíamos após ler as cartelas anteriores. Agora sabemos ser o mês de janeiro, fato que não terá nenhuma importância para a trama.
Felizmente, passado este susto inicial provocado pelo excesso de redundâncias, Besouro decola. A primeira má impressão rapidamente se desfaz por meio de uma narrativa forte, repleta de misticismo. Não sem antes cometer outra cartela totalmente desnecessária: “Sete dias depois...”. Mas tudo bem.
A história (ambientada em 1924, eu já tinha falado?) é baseada no caso - dizem - real de Besouro (Aílton Carmo), capoeirista dos mais hábeis que foi vítima da própria vaidade: escolhido para ser o guarda-costas de seu mestre Alípio (Macalé), jurado de morte, Besouro se descuida da função para se exibir em suas habilidades na capoeira. E, indiretamente, acaba sendo responsabilizado pela morte de seu mentor, uma verdadeira lenda vida (agora morta) do Recôncavo Baiano.
Praticamente banido pela sua própria sociedade. Besouro também é caçado pelo coronel local, atraindo para si a ira e a desconfiança de quase todos na região. Só lhe resta recorrer ao misticismo e às forças ocultas para tentar sobreviver.
Besouro traz inegáveis qualidades técnicas e plásticas. Opta por uma fotografia exuberante, é editado de forma vigorosa e sua criativa trilha sonora evita o que seriam óbvios batuques e berimbaus. Bebe em referências palatáveis ao grande público, como o western spaghetti e os filmes chineses de artes marciais. Mas acaba sendo refém de sua própria estética, vítima de seus próprios maneirismos visuais e sonoros ao cometer o grave pecado de priorizar a técnica em detrimento da emoção.
Assim como seu personagem título, o filme também cai vitimado pela própria vaidade. Mas, mesmo assim, é um entretenimento digno, embora a brasilidade do tema não se reflita na estética. Fãs de western spaghetti e de filmes chineses de artes marciais também vão curtir.
Celso Sabadin
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