É disso que Rodas e sua gangue sentem saudades
O recente episódio suscitado por uma placa, afixada no centro do campus da USP, revelou que não deixa de ser vitorioso o significado político-ideológico que as esquerdas brasileiras difundem sobre os acontecimentos em torno de 1964. Essa interpretação não deixa de ser hegemônica na atual cultura política democrática brasileira.
Por Caio Navarro de Toledo
Na última segunda-feira (3), o blog Viomundo, do jornalista Luiz Carlos Azenha, estranhou o fato de uma placa na USP conter a seguinte inscrição: “Monumento em homenagem aos mortos e cassados na Revolução de 1964”. A indagação do jornalista foi simples e direta: “A USP homenageia as vítimas da 'Revolução de 1964'?" Imediatamente, outros blogs e parte da grande mídia (portais na internet e jornais impressos) também destacaram o fato da Reitoria da Universidade de São Paulo, por meio da placa, ratificar a versão que os militares e setores civis da direita brasileira procuram difundir sobre a intervenção militar ocorrida há 47 anos; qual seja, a versão segundo a qual em 1º. de abril de 1964 teria havido uma Revolução, não um Golpe Militar! [Ninguém desconhece que, para os ideólogos civis e militares (de Delfim Netto a Golbery do Couto e Silva), 1964 representou uma “Revolução redentora” que, de forma pacífica, salvou o país da subversão antidemocrática e do comunismo ateu, bem como lançou as bases para a emergência de uma sólida economia industrial no país. Em contrapartida, para a extensa maioria dos intérpretes (partidos e autores) da esquerda brasileira, 1964 significou um golpe civil-militar contra a democracia política e as propostas de reformas econômicas e sociais do capitalismo brasileiro.]
Divulgada a informação sobre a placa, a repulsa dos setores democráticos e progressistas não tardou. Por meio da internet, a comunidade universitária e os blogs progressistas denunciaram o estelionato semântico difundido pela placa que, reconheça-se – pelo seu conteúdo objetivo –, não deixava de revelar um fato altamente positivo: a construção de um monumento em homenagem às vítimas da repressão militar nos 25 anos de ditadura.
Menos de 36 horas após a denúncia feita no blog Viomundo, alguns jornais, nesta quarta-feira (5), informam que a placa foi retirada do campus da USP. Numa nota a reitoria da USP esclarece: “Houve um erro na inscrição da placa. O nome correto é: “Monumento em Homenagem aos Mortos e Cassados no Regime Militar”. Trata-se de um projeto do Núcleo de Estudos da Violência (NEV) da USP. A correção da placa será feita o mais breve possível”.
Embora a Reitoria da USP recuse a utilização da expressão “Ditadura Militar” na nova placa, deve-se reconhecer que uma vitória no plano simbólico não deixou de ocorrer. Esta pequena vitória foi possível graças às iniciativas daqueles que – face o fascismo cotidiano existente nas democracias capitalistas – exercem o direito de protestar e não ceder ao arbítrio e à violência no plano simbólico.
Foi o que fizeram, por exemplo, três estudantes da USP. Como informa o blog Viomundo, um estudante, desafiando a segurança, riscou a expressão “Revolução de 1964” e escreveu na placa: “golpe”. Dias depois, uma estudante acrescentou a palavra certa: “Ditadura”. Horas depois, indignada, a mesma jovem voltou ao local e escreveu: “massacre”. Uma terceira estudante, blogueira, escreveu em sua página: “É um verdadeiro insulto a todos os estudantes e professores que foram perseguidos e mortos durante os anos de chumbo”. Se não fossem os estudantes, a placa insultuosa – aprovada pelos burocratas da Universidade –, certamente, ali permaneceria sob o olhar indiferente e despolitizado de muitos.
No entanto, alguns jovens não se calaram e se indignaram. São eles que, nos dias de hoje, reescrevem a consequente consigna vigente na luta contra o fascismo: "no pasarán!”.
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